Apesar das desconfianças, a torcida apostava na vitória na estreia em 1970

No quase inverno brasileiro, há 55 anos, a Copa de 1970 alterou a rotina de repartições públicas, empresas, escolas e universidades. Como a transmissão ao vivo pela TV era novidade, o objetivo de qualquer torcedor que não tivesse um aparelho em casa era se arrumar com parentes, amigos ou até mesmo ver os jogos em locais públicos. No total, o Brasil tinha quatro milhões de televisores para uma população de 90 milhões de pessoas, de acordo com o IBGE.
A edição de 31 de maio do Estadão trazia um informe do Rio de Janeiro: “Desde ontem, o carioca está fazendo seus preparativos para assistir aos jogos da Copa, cancelando os programas preestabelecidos para a tarde de hoje, uma vez que o jogo México versus Rússia será televisionado diretamente, via Intelsat, para o Brasil. Os que não têm televisor em suas casas, poderão escolher entre assistir aos jogos em casa de amigos ou nas ruas do Rio, diante das vitrinas de lojas de eletrodomésticos, as quais já se dispuseram a deixar um aparelho de televisão ligado durante a transmissão dos jogos do Campeonato Mundial de Futebol. As reitorias das universidades, por sua vez, informaram que poderão alterar o horário das aulas, a fim de tornar possível aos alunos assistir aos jogos. (…) Na Cinelândia e em vários pontos da cidade já começaram a ser fixados enormes ‘placards’ para acompanhamento dos jogos. Serviços de alto falantes foram instalados para retransmitir as partidas.”
Antes da estreia da seleção, em 3 de junho, o Brasil vivia grande expectativa, com direito a uma pesquisa de opinião feita pela imprensa. Como em toda Copa, mesmo quem não gosta de futebol, acaba assistindo aos jogos: “(…) Mas há também os que não querem, mas assistirão ao jogo quase obrigatoriamente: ‘Eu não entendo muito de futebol e não tenho ideia de quem possa ganhar o jogo de hoje’ – explica uma velha senhora, enquanto faz compras na rua da Consolação. Mas ela está agora diante de um aparelho de televisão, ao lado de seu irmão e seus sobrinhos – ‘eles insistem comigo para que eu assista, e eu acabo assistindo mesmo’. Quem não vai assistir: um funcionário da CMTC e sua mulher que não gostam de futebol; dois operários em construção que nem ouviram falar do jogo; um cozinheiro de restaurante que a essa hora estará trabalhando e o patrão proíbe o rádio em serviço. São personagens de uma pesquisa feita com 100 pessoas na cidade, pela reportagem do ‘Estado’. Em cada 10 pessoas ouvidas, apenas uma acompanha o jogo pelo rádio. 3 a 1 para o Brasil é o resultado mais provável na opinião das pessoas ouvidas. (…) O coveiro do cemitério da Consolação ainda não sabe se vai dar tempo: ele trabalha até as 6 da tarde e seu irmão, que tem televisão, mora no Jardim Tremembé, para onde a condução é muito difícil.”
A seleção brasileira estava escalada para o duelo contra a Tchecoslováquia, em Guadalajara, no México: Félix; Carlos Alberto, Brito, Piazza e Everaldo; Clodoaldo e Gérson; Jairzinho, Tostão, Pelé e Rivellino. Na coluna de amanhã do “Memória da Pan”, destaco a estreia da equipe comandada por Zagallo. Uma viagem no tempo, 55 anos depois.