BBB do Mal? Especialista em transtornos fala sobre superexposição em realities e redes sociais

Os episódios que antecedem o início de mais uma edição do “BBB” já colocaram em questionamento muitas coisas. Na chamada Casa de Vidro exposta em um shopping do Rio de Janeiro, Giovanna Leão, uma das participantes, entrou em desespero ao notar que estava sendo “cancelada” por conta de postagens antigas que remetiam a racismo. A ruiva, anunciada como influencer, surtou, gritou, chorou e chegou a ofender as pessoas, desesperada com informações de seu passado que vinham à tona a cada clique no Google da plateia, que assistia a tudo, fotografava, ria e opinava. Diante da estreia do programa que faz o brasileiro não pensar no que acontece ao redor, vivemos a brincadeira de assistir manipulação, julgamento e provocações de pessoas que não conhecemos. Se a gente parar para pensar, o “BBB” é uma extensão das redes sociais: acompanhamos a rotina de pessoas que não somos próximos, dando palpite em tudo o que acontece, e o nome que dão a isso é diversão. Diversão para quem? 

Para Taty Ades, psicanalista pós graduada em Neuropsicologia e especialista em Transtornos, nós sofremos diariamente situações parecidas com a de Giovanna, principalmente com relação às redes sociais: nosso novo bicho papão tem outro nome e se chama “cancelamento”. “É claro que o reality está em uma projeção e proporção muito maior, mas o problema é que, dentro de um reality ou não, as pessoas estão mais preocupadas em serem boas o suficiente para o outro e não para elas mesmas. Quando a imagem que queremos passar fica maior do que a nossa própria essência, é que podemos desencadear transtornos de personalidade e muitos outros problemas. É preciso estar atento a esse cenário e agir rápido. O medo de ser você mesmo, de ser cancelado, de ser excluído, pode levar a quadros profundos de depressão, Borderline, dentre outros distúrbios”, explica a profissional.

A própria sociedade gera esse inconsciente coletivo do que precisa ser validado ou não, aprovado ou não, e, à partir daí, acontecem os gatilhos. É claro que, se falando de um reality, em que existe competição por um prêmio em dinheiro, superexposição e ainda, enclausuramento porque os participantes estão isolados de tudo e todos, os perigos aumentam em mil por cento. “Todos nós temos a necessidade de aprovação desde cedo, por nossos pais, depois amigos, parentes, depois do cônjuge e assim vai, porém, isso deve acontecer de forma natural. Já em um confinamento, além da competitividade e da obrigatoriedade de conviver com pessoas estranhas, existe o fator de que você foi retirado de sua zona de conforto, e isso gera uma insegurança maior ainda”, detalha Ades.

Ainda, a especialista comenta que, quando o participante volta para o mundo real, sente as sequelas do que vivenciou da melhor forma que achou para aquela situação, sendo que nada do que fez pode ser apagado. “Muitos participantes saem de realities relatando transtornos, dificuldades de relacionamento, com fobias e medos que antes não existiam. Atendo muitas pessoas em consultório que desenvolveram tudo isso sem participar de programas de televisão, apenas não sabendo dosar o poder que as redes sociais tem em suas vidas. Em alguns casos, pacientes preferiam viver a vida da internet à vida real e isso é muito grave. Então com certeza essa sociedade pode causar síndrome sim, como por exemplo, fobia social, dentre muitas outras. É preciso saber usar as redes e, principalmente, perceber que não é necessário ter estímulos externos para estar bem consigo mesmo. Quando a gente está bem com a gente, tudo flui e o bicho papão desaparece, porque não estamos tentando nos validar, estamos sendo verdadeiros, sem mentiras, sem máscaras, sem maquiagem ou filtro”, fala. 

Particularmente, gosto de uma frase que vi na internet e já ouvi em terapia que diz que não precisamos ser melhores que ninguém. Eu apenas quero ser a minha melhor versão hoje, a melhor versão de mim hoje, do que ontem, ou seja, sem pressão, sem amarras, sem julgamentos, mas sempre, sempre, com empatia, afinal, estamos precisando de mais amor, por favor. Ah, e como diz a Monica Martelli em uma entrevista recente, é preciso aprender que a gente não consegue dar cem por cento da gente todos os dias, em todas as áreas, sempre. E está tudo bem. É preciso, saber viver, já dizia também a música.