Bolsonaro e Malafaia dão aula de oratória na manifestação de 25 de fevereiro

Alguns momentos fazem da oratória marcos excepcionais para mostrar a força e a importância dessa arte. Alguns discursos são repetidos à exaustão por sucessivas gerações. É o caso do famoso “I Have a Dream” proferido por Martin Luther King Jr, em 1963, diante de 250 mil pessoas, no Lincoln Memorial durante a “Marcha sobre Washington”. Para citar mais um exemplo de pronunciamentos inesquecíveis, um dos mais extraordinários discursos de todos os tempos, “O Discurso de Gettysburg”, proferido por Abraham Lincoln em 1863. Talvez não haja na história peça oratória mais citada que esta. Foram apenas 272 palavras, proferidas em menos de dois minutos, que atravessaram o tempo e ficarão para a eternidade. Poucos não ouviram pelo menos um trecho dessa fala memorável. Como, por exemplo, a sua conclusão: “Que todos nós aqui presentes solenemente admitamos que esses homens não morreram em vão, que esta nação, com a graça de Deus, renasça na liberdade, e que o governo do povo, pelo povo e para o povo jamais desapareça da face da Terra”.
O dia 25 de fevereiro foi palco para mais um desses discursos marcantes. Desta vez, proferido pelo pastor Silas Malafaia, na manifestação da Avenida Paulista. O Judiciário, a imprensa e a oposição estavam de olho no seu discurso e no de Bolsonaro. Todos sabiam que os dois caminhavam nesse evento por pântanos movediços. Bastaria um pequeno deslize para que sofressem pesadas consequências. Até os aliados do ex-presidente estavam com receio do que ele pudesse falar. Sua situação era delicada, pois para cumprir a promessa de se defender precisaria, em tese, criticar aqueles que alegou serem seus perseguidores.
Tanto Bolsonaro quanto Malafaia estavam conscientes de que não poderiam errar. Principalmente o ex-presidente que está nas cordas, com receio de que a qualquer momento possa ser preso. Sem criticar frontalmente o Judiciário, fez sua defesa. De maneira contida e até didática, argumentou que a minuta de golpe, que o acusam de planejar, continha apenas informações que estão dentro dos limites constitucionais. Esclareceu que o Estado de Sítio não é um golpe porque está previsto na Constituição. Explicou ainda que para existir um golpe é preciso haver tanque, arma, conspiração, e que nenhuma dessas condições existiram. Dessa forma, deu satisfação aos seus seguidores, que esperavam uma explicação para as acusações que têm recebido, sem agravar ainda mais sua situação perante a justiça.
Silas Malafaia foi um gigante naquele palco montado sobre o caminhão. Conseguiu manter a plateia de centenas de milhares de pessoas atentas durante 23 minutos. De forma habilidosa, depois de ter atingido a metade do discurso, a todo instante dizia que estava partindo para o encerramento. Com essa expectativa criada, foi alimentando o interesse do público. Malafaia fez um cuidadoso levantamento histórico de todos os episódios em que Bolsonaro foi envolvido injustamente. Em vários momentos, depois de ter avançado com a cronologia dos fatos, retornava para fazer comentários complementares, preenchendo as lacunas que intencionalmente havia deixado para trás. Ao contrário do ex-presidente, não mediu palavras para censurar as ações do Judiciário. Segundo ele, apoiado em provas divulgadas até pela grande imprensa. Disse, por exemplo, que o Judiciário monta “uma engenharia do mal” para prender Bolsonaro. Comentou também sobre o risco de ser preso: “Ter medo de defender a sua liberdade (de Bolsonaro) e a liberdade do povo brasileiro? É honra para mim.”
De forma eloquente, demonstrando indignação nas palavras, fez a defesa do ex-chefe do Executivo. Com uma perfeita utilização da anáfora, uma das mais elegantes figuras de linguagem, enfatizou: “Se eles te prenderem, você vai sair de lá exaltado. Se eles te prenderem, não vai ser para a sua destruição, mas para a destruição deles”. Como havia multidão dos dois lados da avenida, privilegiou a todos, andando de um lado para o outro. Essa movimentação foi útil para não perder a atenção dos ouvintes. Falou com voz forte e firme. Poucos teriam condições de se apresentar com volume tão intenso sem enrouquecer. Ao contrário, à medida que discursava, sua voz ganhava ainda mais consistência.
Fez um encerramento brilhante, pedindo ao povo que cantasse com ele trechos do Hino à Bandeira. E as pessoas acataram sua sugestão e cantaram com ele a plenos pulmões. Foi, sem dúvida, um dos melhores discursos já proferidos. Poderá servir de modelo e exemplo para todos aqueles que desejam aprender e se aprimorar na arte oratória. Siga pelo Instagram: @polito.