CEO da Zendesk quer uma plataforma na qual humanos e IA aprendam juntos

Tom.Eggemeier Zendesk

A Zendesk está apostando todas suas fichas na Inteligência Artificial (IA) generativa. A estratégia não surpreende: dos casos de uso atuais da tecnologia, o atendimento ao cliente ou a experiência do cliente (CX) são algumas das áreas nas quais empresas têm encontrado mais resultados. Agentes virtuais da Zendesk, por exemplo, já alcançam uma resolutividade de atendimentos de até 80% em alguns casos.

A companhia, no entanto, quer chegar aos 100%. Para isso, tem apostado em uma série de aquisições nos últimos meses, além de desenhar uma estratégia para treinar agentes humanos e agentes de IA simultaneamente, ampliando as capacidades de sua tecnologia. “Às vezes a IA responde uma pergunta melhor tecnicamente, mas os clientes ficam mais satisfeitos com a empatia de um humano. Então, queremos transferir esse conhecimento para que os humanos melhorem suas respostas e a IA melhore em áreas como empatia”, explicou Tom Eggemeir, CEO da Zendesk em conversa com o IT Forum.

O executivo, que assumiu a liderança da companhia em 2022, esteve no Brasil nesta semana para uma rodada de reuniões com clientes e com seu time – que já soma mais de 160 funcionários locais e tem atuado na expansão dos negócios da companhia no país. Ao IT Forum, o líder da Zendesk também falou sobre o potencial do mercado brasileiro para a companhia, sobre sua nova estratégia de precificação e sobre os próximos passos da IA.

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IT Forum: Você assumiu a liderança da Zendesk em novembro de 2022. Isso é muito interessante, pois coincide com o lançamento público do ChatGPT. Então, você tem acompanhado a transformação causada pela IA generativa desde o princípio frente à Zendesk. Como você vê a evolução dessa tendência?

Tom Eggemeir: Eu tenho ouvido sobre o impacto da IA no atendimento ao cliente há ao menos vinte anos. Houve muitos ciclos de hype ao longo dos anos com pequenos avanços, mas a IA generativa é um avanço real. Um exemplo: há dois anos, nós não tínhamos praticamente nada em novas vendas relacionado a IA. Neste ano, estamos nos aproximando dos 20%.

Acredito que isso se deve a algumas coisas: a tecnologia agora é realmente boa, o que não era verdade no passado; e o mercado, de forma geral, está entregando valor ao cliente. Com a Zendesk, nós temos bots que conseguem fazer algo entre 20% e 80% das interações, dependendo da vertical em que está sendo utilizado. Nós conseguimos tornar agentes humanos de 10% a 30% mais eficientes no atendimento ao cliente. Então, nós saímos de uma discussão de tecnologia para uma discussão de negócio sobre como podemos ajudar clientes a resolver os problemas de seus clientes melhor e mais rapidamente.

ITF: Estamos ouvindo muitas empresas falando sobre a preocupação com o retorno sobre investimento (ROI) de projetos de IA generativa. Como a relação entre Zendesk e os clientes tem se transformado nesse aspecto?

TE: Acredito que as implementações e projetos mais bem-sucedidos começam com o caso de negócio. Recentemente, estive em uma reunião com o COO de uma grande empresa e delineamos, de forma bem clara, que eles queriam que 20% das interações com clientes fossem resolvidas por um bot automatizado – e queriam fazer isso com uma satisfação do cliente maior do que ao lidar com um agente humano. Então, tínhamos métricas de negócio muito claras desde o início.

Para eles, isso é ótimo, pois obtêm respostas mais rápidas e uma maior satisfação, já que a maioria dos clientes, especialmente no Brasil – e eu acho que isso se deve ao fato de que a população no Brasil é mais jovem em comparação a alguns outros lugares do mundo – está muito aberta à inteligência artificial (IA).

A maioria das pessoas só quer que seus problemas sejam resolvidos rapidamente, de forma precisa. Então, essa discussão sobre o retorno sobre investimento (ROI) é realmente muito importante. Eu diria que, no passado, estávamos mais focados em recursos e funcionalidades, e mais limitados em casos de negócios. Agora, praticamente toda conversa sobre IA gira em torno de como podemos ajudar a empresa a economizar dinheiro e como fazer isso de uma maneira que impacte positivamente os clientes.

ITF: Falando especificamente sobre o Brasil. Você já falou anteriormente que vê o país se tornando o segundo principal mercado para a Zendesk no mundo entre cinco e dez anos. Como vocês esperam alcançar esse crescimento aqui?

TE: Olhando de fora, há alguns aspectos interessantes. Primeiro, vocês têm uma lei que exige que uma interação por telefone seja respondida em até um minuto, o que considero um requisito regulatório que reconhece a importância do atendimento ao cliente e das interações com os clientes.

O segundo ponto é que, como uma das economias que mais cresce no mundo, vemos que o Brasil continuará a ter uma população cada vez mais educada, com uma classe média em expansão, que vai exigir mais do atendimento ao cliente.

E em terceiro, acreditamos que nossa proposta de valor ressoa especialmente bem com os nativos digitais: nossa tecnologia está voltada para soluções digitais, com resolução automatizada. E todos os nossos estudos, por exemplo, mostram que 79% dos líderes de experiência do cliente (CX) no Brasil afirmam que a IA está fazendo suas empresas repensarem a experiência do cliente.

Globalmente, esse número é 10% menor. Além disso, 87% dos consumidores no Brasil esperam que os agentes e representantes os ajudem com tudo que precisam, desde vendas até suporte. Globalmente, esse número também é cerca de 10% menor. Isso reforça que o Brasil tem uma forte cultura de atendimento ao cliente e uma geração mais jovem acostumada com iPhones e gratificação instantânea, o que está alinhado com nossa proposta de valor.

ITF: Hoje o Brasil é o quarto principal mercado para a companhia?

TE: Correto. Os Estados Unidos são o primeiro, o Reino Unido é o segundo, a Alemanha, o terceiro. Depois vêm o Brasil e o Japão, em quinto.

ITF: Voltando para o tema de IA, a Zendesk fez uma série de aquisições nos últimos anos focadas na evolução dos seus produtos com IA. Isso deve continuar no futuro?

TE: Eu acredito que o produto é o que realmente diferencia uma empresa de tecnologia. Vamos continuar a investir em pesquisa e desenvolvimento, ampliando nossa base de produtos e o uso de IA. Além disso, continuaremos a realizar fusões e aquisições (M&A). Nós queremos continuar liderando o mercado em inovação, e com o mercado se movendo rapidamente, não podemos fazer isso só de forma orgânica. Sempre haverá empresas que desenvolvem certas tecnologias melhor do que nós. Um exemplo é o nosso bot tradicional, que era um bot muito sólido baseado em bases de conhecimento e que fornecia respostas.

No entanto, ele não estava evoluindo rapidamente o suficiente com a IA generativa, então adquirimos uma empresa chamada Ultimate, sediada em Berlim. Estamos comprometidos em continuar investindo fortemente em nossos próprios recursos, alocando quase 20% da nossa receita em pesquisa e desenvolvimento. Além disso, continuaremos a realizar fusões e aquisições no espaço de IA e no que chamamos de “serviço ao funcionário”. Atualmente, cerca de 80% do nosso negócio é voltado para atendimento ao cliente, e 20% para o serviço ao funcionário. Vamos continuar expandindo nossa plataforma para que nossos clientes possam contar com uma única solução que abranja a experiência de atendimento ao cliente e ao funcionário.

ITF: A Zendesk também anunciou recentemente um fundo de venture capital para investimento em startups focadas em IA. Há oportunidades que vocês enxergam no Brasil?

TE: Com certeza. Quando criamos o fundo de venture capital, não estávamos esperando obter grandes lucros com ele. O objetivo principal é atrair startups para o nosso marketplace, porque, mesmo que gastássemos bilhões de dólares por ano em desenvolvimento de produto, nunca seria suficiente para implementar todas as inovações que nossos clientes desejam. Em segundo lugar, aprendemos coisas novas com as empresas em que investimos e sobre como fazer parcerias melhores com elas. Essa é outra razão pela qual criamos esse fundo.

Estamos totalmente abertos a fazer negócios no Brasil, seja investindo no marketplace ou adquirindo empresas. Minha experiência é que o Brasil é um lugar muito empreendedor, com muito mais habilidades em software do que as pessoas podem imaginar. Outra coisa que nos interessa por aqui são as habilidades linguísticas. O português brasileiro, naturalmente, é essencial para o Brasil e Portugal, mas as habilidades em inglês e espanhol aqui são fantásticas. A América Latina, como um todo, é uma das nossas regiões de crescimento mais rápido, e o fato de muitos brasileiros com quem trabalhamos terem boas habilidades em software, além de competências linguísticas, é uma grande vantagem.

ITF: A Zendesk também anunciou recentemente um novo modelo de receita baseado no crescimento do cliente. Qual o objetivo dessa estratégia?

TE: Anunciamos isso globalmente porque queremos nos alinhar completamente aos resultados dos nossos clientes. A única situação em que deveríamos ser pagos é quando o bot realmente resolve o problema dos clientes do nosso cliente. Se houver uma interação que precise ser transferida para um humano, isso não significa resolver o problema. Chamamos isso de precificação baseada em resultados. Os clientes podem optar por participar ou não desse modelo. Existem outros modelos de precificação, caso prefiram seguir um modelo mais tradicional, mas recomendamos que sigam essa abordagem, pois acreditamos que esse será o futuro.

ITF: Você comentou que bots com IA já são capazes de resolver até 80% dos atendimentos, mas espera chegar a 100% de resolutividade. Quais são os próximos passos?

TE: Estamos investindo muito tempo em nossa plataforma para combinar bots com agentes humano. Esperamos que as interações aumentem cerca de cinco vezes nos próximos três a cinco anos. Isso acontece porque, à medida que as interações se tornam menos complicadas, os consumidores tendem a interagir mais. Por exemplo, quando queria verificar o saldo bancário antigamente, precisava ir fisicamente ao banco. Depois, isso evoluiu para chamadas de voz, e agora faço isso online com muito mais frequência.

Esse tipo de mudança, do físico para o digital, tende a aumentar o número de interações. Com isso, precisamos estar preparados para uma explosão no volume de interações, e é essencial ter uma plataforma bem integrada entre IA e agentes humanos. Humanos cometem erros, e bots também podem cometer erros – é o que chamamos de “alucinações” da IA.

Queremos uma plataforma que permita treinar mutuamente humanos e IA. Por isso, adquirimos a empresa Klaus, de Tallinn, na Estônia. Eles analisam e pontuam cada interação de IA e de humanos, ajudando a entender em que casos um humano é mais eficaz e em quais a IA faz um trabalho melhor. Por exemplo, às vezes a IA responde melhor tecnicamente, mas os clientes ficam mais satisfeitos com a empatia de um humano.

Então, queremos transferir esse conhecimento para que os humanos melhorem suas respostas e a IA melhore em áreas como empatia. Precisamos melhorar essa interação rapidamente porque, como mencionei, esperamos que o volume de interações aumente cinco vezes nos próximos três a cinco anos.

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