Crise com os Estados Unidos deve deixar o Brasil ainda mais perto da China

A imposição de uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a partir de 1º de agosto, está forçando o Brasil a uma guinada estratégica em sua política externa e comercial, aproximando-o ainda mais da China. A medida, anunciada por Trump em uma carta pública ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é justificada por alegações de déficit comercial — infundadas na visão brasileira — e críticas diretas ao Judiciário brasileiro e ao processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.

A decisão unilateral de Trump pegou o governo brasileiro de surpresa e, desde o anúncio, não houve novos contatos entre autoridades de ambos os países para negociação. O canal de diálogo havia sido aberto em março para discutir a proteção das exportações brasileiras de aço e alumínio, já tarifadas em 25%, e de outros bens com uma taxa adicional de 10%. Com a nova sobretaxa, integrantes do governo admitem que as conversas podem se tornar ainda mais difíceis.

Na carta a Lula, Trump atribuiu a sobretaxa de 50% a supostos “ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres” e à “violação fundamental da liberdade de expressão dos americanos”, citando ordens secretas do Supremo Tribunal Federal (STF) a plataformas de mídia social dos EUA. Ele também justificou a medida afirmando que a relação comercial com o Brasil é “injusta”, alegando um déficit comercial que, na verdade, não existe. Dados oficiais mostram que o Brasil tem registrado déficits comerciais seguidos com os EUA desde 2009, totalizando US$ 90,28 bilhões até junho de 2025.

Além disso, Trump anunciou a abertura de uma investigação da Seção 301 contra o Brasil por “práticas comerciais desleais” e ameaçou retaliar qualquer aumento de tarifas por parte do Brasil. A Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 dos EUA é um mecanismo que permite ao país investigar e aplicar sanções contra parceiros comerciais.

O presidente Lula reagiu de forma incisiva, afirmando que o Brasil “não aceitará ser tutelado por ninguém” e que o aumento unilateral de tarifas será respondido com base na Lei da Reciprocidade Econômica. Lula enfatizou que o processo judicial contra os envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023 é de competência exclusiva da Justiça brasileira e não está sujeito a ingerências externas.

O governo brasileiro, por meio da embaixadora Maria Luisa Escorel, devolveu a carta de Trump, considerando-a “ofensiva” e “inaceitável”. Lula também criticou a forma como o americano fez o anúncio e reiterou que, se não houver acordo diplomático, o Brasil retaliará, possivelmente recorrendo à Organização Mundial do Comércio (OMC) — embora esta esteja engessada por boicotes dos EUA — ou adotando medidas como a cassação de patentes e a elevação de tributos sobre bens culturais americanos.

A avaliação do governo brasileiro é que os “ataques” da gestão Trump reforçarão os laços políticos e econômicos com Pequim. A China, principal parceira comercial do Brasil, já saiu em defesa do país, com a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Mao Ning, classificando a decisão de Trump como um “abuso” e defendendo que “guerras comerciais e tarifárias não têm vencedores”.

Essa aproximação é impulsionada não só pela retórica, mas por projetos concretos. O governo chinês aprovou recentemente o financiamento para a construção da Ferrovia Bioceânica, uma obra ambiciosa que conectará o Brasil ao Oceano Pacífico, facilitando a exportação de commodities agrícolas e minerais para a Ásia. Este projeto, que ligará Luís Eduardo Magalhães (BA) ao porto de Shancai (Peru), é visto como estratégico para integrar o Brasil à “nova rota da seda” e reduzir a dependência de rotas como o Canal do Panamá. Embora empresários brasileiros expressem certo temor pela possível priorização da indústria chinesa na fabricação de trens, a ferrovia bioceânica promete transformar a logística de exportação e fortalecer ainda mais os laços comerciais Brasil-China.

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A postura de Trump, que também ameaçou aplicar tarifas de 10% aos países do Brics por tentarem “destruir o dólar”, parece consolidar a estratégia brasileira de diversificar seus parceiros internacionais, com a China emergindo como um porto seguro em meio às turbulências das relações com os Estados Unidos. A geopolítica se desenha com o Brasil cada vez mais voltado para o Oriente, em busca de estabilidade comercial e apoio em um cenário global complexo.

Publicada por Felipe Dantas

*Reportagem produzida com auxílio de IA