Eleição em Taiwan aumenta tensões entre EUA e China

A população de Taiwan decidiu no fim de semana que Lai Ching-Te (DPP) será o novo presidente da ilha. O resultado marca uma vitória do Partido Democrático Progressista (DPP), que é pró-independência de Taiwan, pela terceira vez seguida, algo sem precedentes. Para Alexandre Coelho, doutor em relações internacionais e especialista do Observa China, é possível que as retóricas inflamadas entre os dois países aumentem. A condição pode ser entendida como um sinal de aumento de tensões entre as duas maiores economias do mundo. As eleições presidenciais nos EUA, que ocorrerão em novembro, também precisam ser monitoradas para efeitos geopolíticos e de impactos no agronegócio. Confira detalhes na entrevista:

Qual é o perfil de Lai Ching-Te, vencedor das eleições presidenciais em Taiwan? Ele prega uma reaproximação, um fortalecimento dos laços com o Japão, com os Estados Unidos e com parceiros da Europa também.

As eleições em Taiwan já estão complicando a relação entre Estados Unidos e China? A Embaixada da China em Washington, por exemplo, já disse que se opõe firmemente que os Estados Unidos tenham qualquer forma de contato oficial com a região de Taiwan. As relações entre Estados Unidos e China estavam num crescente do ponto de vista negativo, num crescente de retóricas inflamadas, retóricas de guerra, especialmente até o final de 2022 e começo de 2023. Até então, os dois países começaram, tentaram iniciar diálogos e encontros para realizar uma distensão das relações, especialmente depois do encontro na Apec e também entre outros diálogos e as visitas, por exemplo, da Janet Yellen a Pequim e do secretário de Estado, Anthony Blinken, a Pequim. O que acontece com a eleição é que realmente você vai ver um aumento novamente, quase que uma neutralização aí desse processo de distensão, você vai ver novamente um aumento dessas retóricas inflamadas dos dois países. Mas isso não vai, na minha opinião, isso não significa ainda que haverá um conflito militar ou um conflito armado, mas, sim, a manutenção dessas retóricas inflamadas, retóricas de guerra.

Isso tem alguma relação com as eleições dos Estados Unidos? A depender de quem assumir a liderança da principal economia do mundo, a relação com Taiwan também pode mudar? Nós temos que avaliar duas variáveis que são muito importantes: a eleição em Taiwan, obviamente, e a eleição dos Estados Unidos no final do ano. Essa eleição é muito importante. Se Trump ganhar… Em discursos passados, na época em que era presidente dos Estados Unidos, por exemplo, Trump dizia que Taiwan havia obtido, digamos, talvez ilegalmente ou obtido, digamos, entre aspas, “roubado” a tecnologia de semicondutores dos Estados Unidos. De acordo com outro discurso do próprio Trump também, ele não via nenhum benefício em exportar armamentos para Taiwan e também nenhum benefício em defender Taiwan em caso de um conflito. Então, dependendo das eleições dos Estados Unidos, de quem ganhar, a China, não vai precisar considerar o fator, ou não considerar, mas diminuir, o fator Estados Unidos, caso Xi Jinping resolva realizar uma reunificação com Taiwan de forma mais assertiva ou à força. Ou seja, acredito eu que a China deve calcular ainda muito bem do ponto de vista geopolítico as informações e o que deve ocorrer nos Estados Unidos até o final do ano. É óbvio que a gente não pode aqui cravar ou escrever na pedra que não vai haver guerra ou que haverá um conflito. Mas, a gente tem algumas tendências, de acordo com algumas declarações do representante do Ministério do Exterior da China. Recentemente eles disseram que não pretendem entrar em conflito com os Estados Unidos e que a preferência da China é se reunificar com Taiwan, mas de forma pacífica, não de forma conflituosa. Por outro lado, há uma notícia de que a China deve partir para um conflito, dependendo do resultado das eleições. Então, você tem aí sempre discursos que levam a um lado ou a outro. Mós devemos verificar quais serão as reações do presidente XI Jinping e quais as reações talvez da política interna, porque a política interna determina a política externa de um país. Caso Xi Jinping veja nisso mais um desafio à manutenção de Taiwan de forma independente, ele deve aumentar sua retórica.

Quais seriam os impactos para o agro? Do ponto de vista prático, acredito que talvez seja neutro porque a China é muito pragmática. Então, se ficar só no plano da retórica, pelo menos até o final do ano, e se os Estados Unidos não tomarem nenhuma medida do ponto de vista de taxação de importação de produtos chineses. Porque, se os Estados Unidos tomarem algumas atitudes retaliatórias do ponto de vista comercial, como taxação de produtos, aumentarem a taxação de importação de produtos chineses, por exemplo, como já fizeram com relação à importação de aço, aí, sim, haverá impactos positivos, por exemplo, para o agro brasileiro. A China deve procurar aumentar as importações de commodities brasileiras e de outros países de outros players no mundo, e isso pode beneficiar o Brasil. Mas o país tem que estar pronto para isso, né? Por exemplo, com relação a gastos com transporte, exportação, qualidade de produto, enfim, uma série de outras coisas. Se o país estiver preparado e dependendo de quais serão as atitudes tomadas pelos Estados Unidos ou pelo presidente Xi, realmente pode ser benéfico para o Brasil. Mas, sempre lembrando que a China é muito pragmática. Mesmo em situações de conflito ou como essas atuais, a China vai continuar importando produtos dos Estados Unidos, desde que os preços e a qualidade estejam de acordo, enfim, uma série de outros itens estejam de acordo.