Entenda os problemas envolvendo os altos valores de multas aplicadas pelos Procons

Como base desta coluna semanal, sempre consideramos a proteção ao consumidor como um tema de grande relevância, compreendendo a importância dos Procons nesse contexto. Criados com o objetivo de proteger e defender os consumidores, os Procons atuam em áreas como fiscalização, atendimento ao público e educação para o consumo. Não bastasse isso, os Procons também possuem o poder de aplicar multas às empresas que desrespeitam os direitos dos consumidores. Para isso, contam com uma dosimetria própria, elaborada de forma independente e conforme entendimentos dos referidos órgãos. 

Muitos são os casos divulgados de multas milionárias aplicadas pelos Procons contra as empresas. Mas você já parou para analisar como um Procon calcula as multas que aplica? Será que a fórmula utilizada é justa ou apresenta algum problema? A dosimetria da multa tem como base o próprio Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) e é utilizada como forma de punir empresas infratoras e prevenir futuras infrações. Essa fórmula considera diversos fatores, tais como a gravidade da infração, a vantagem auferida pelo infrator, a condição econômica do infrator, entre outros. No entanto, a dosimetria das multas aplicadas pelos órgãos tem gerado inúmeras controvérsias, especialmente em razão da existência de erros presentes nas fórmulas e de equívocos percebidos quando da estipulação das multas. Trata-se de um problema da mais alta relevância e que precisa ser enfrentado por todos os agentes envolvidos (Procons, empresas e o Poder Judiciário).

Uma das principais reclamações e distorções apresentadas pelas empresas está intimamente ligada à falta de transparência na definição dos valores de cada componente da fórmula. Além disso, mesmo que esse ponto sempre seja ressaltado, não existe nem mesmo um mecanismo de ajuste da fórmula para casos específicos em que exista flagrante identificação de multas desproporcionais. Uma maior flexibilidade da regra e sua maior transparência são formas mais eficazes de melhorar a dosimetria. Além da revisão dos critérios, é preciso garantir um melhor acesso às informações para as partes envolvidas, partindo inclusive do auto de constatação do suposto dano ao consumidor.

Outro problema existente e muito observado pelas companhias é a “base de cálculo” utilizada pelos Procons. Estas bases de cálculo nem sempre consideram o real impacto da infração ao consumidor, algo que pode resultar no surgimento de multas desproporcionais. Na mesma linha, cito a inexistência de uma ponderação sobre os fatores agravantes e atenuantes, algo que também contribui para a deturpação na hora de estipular as multas.

Todos esses equívocos existentes quando da estipulação da multa, em razão da ausência de critérios claros e objetivos, acaba gerando uma enorme insegurança jurídica e muita dificuldade na análise dos casos concretos. Esta incerteza acaba impactando no comportamento das empresas, não apenas no que se refere ao pagamento espontâneo de algumas destas multas, mas também desestimulando o investimento em melhorias e condições preventivas, uma vez que serão impactadas pelo pagamento de altos valores estipulados pelos órgãos. Multas excessivas prejudicam a saúde financeira de uma empresa, limitando sua capacidade de investimento e crescimento.

E não é apenas a empresa que sofre com esta situação, já que todo esse impacto será sentido pelos consumidores. Se uma empresa é excessivamente multada, esta situação pode refletir em um aumento de custo nos preços dos produtos ou serviços, prejudicando diretamente o consumidor final. Existem inúmeros casos que ilustram falhas na dosimetria das multas, especialmente em casos em que se observa multas aplicadas em valores desproporcionais ou sem levar em conta o contexto específico da infração. Se, por um lado, é menos recorrente a reversão administrativa dos valores arbitrados, por outro é possível destacar o crescente aumento de casos em que os valores das multas foram revertidos na esfera judicial. 

Uma proposta de melhoria para a fórmula de dosimetria seria a revisão dos critérios utilizados e a inclusão de um mecanismo de ajuste que permita levar em consideração as particularidades de cada caso. Outra proposta seria tornar o processo de revisão das multas mais transparente, permitindo que as empresas compreendam como a multa foi calculada e tenham a possibilidade de contestar os valores antes de recorrer à justiça.

Importante destacar que não somos contrários à existência de fórmulas que permitam aos Procons o arbitramento de multas contra as empresas, mas devemos atuar para que as multas tenham o seu devido peso e se apresentem de forma proporcional ao fato ocorrido. É preciso que seja feita uma revisão dos critérios atualmente utilizados, incluindo a participação da sociedade, através de consulta pública, contemplando a presença das empresas, consumidores e especialistas no assunto. Esta revisão pode contribuir para uma dosimetria mais justa e eficiente. A correção destas falhas é necessária, inclusive para que a multa cumpra sua função de forma adequada. A revisão dos critérios das fórmulas e a transparência no processo de revisão das multas são passos importantes nesta direção, não apenas como forma de assegurar a efetividade das penalidades, mas também no sentido de reduzirmos grandes injustiças e inúmeras discussões judiciais.