Facção Povo de Israel tem ‘estatuto’ inspirado no PCC

“Respeitar a família, não delatar outros membros da facção e evitar confusões dentro dos presídios” são apenas algumas das regras da organização criminosa Povo de Israel similares às impostas aos membros do PCC (Primeiro Comando da Capital), conforme apontam as investigações analisadas no Tribunal de Justiça de São Paulo, que busca compreender como as facções agem. Existente desde 2004 em diferentes unidades prisionais do Rio de Janeiro, o “estatuto” elaborado pela quadrilha carioca determina que, para fazer parte do bando, é necessário seguir essas “diretrizes”.

A principal diferença entre as facções fluminense e paulista está nos crimes praticados pelos integrantes. De acordo com a desembargadora Ivana David, do TJSP, o Povo de Israel teve início para apoiar os “renegados” do PCC. “O Primeiro Comando da Capital não aceita detentos de crimes sexuais (estupradores, pedófilos). Foi aí que o Povo de Israel conseguiu crescer no sistema prisional, expandindo a rede criminosa.” Conforme ela, ambas nasceram dentro das prisões com similaridades nas condutas impostas aos integrantes, sendo a questão de crime sexual a exceção das regras. “O fundador do Povo de Israel, inclusive, é um preso que respondeu por crimes sexuais. O sistema prisional sempre rejeitou criminosos envolvidos com isso. O PCC, por exemplo, e outras facções criminosas, tem a ‘cláusula’ no estatuto que despreza presos envolvidos com isso. Então, ele nasce dentro desse nicho que as outras organizações criminosas sempre rejeitaram.”

A desembargadora Ivana David,. do Tribunal de Justiça de São Paulo (Arquivo Pessoal)

Investigações apontam que o Povo de Israel, já conta com mais de 18 mil integrantes atualmente. E para não criar guerras com outras facções, principalmente o PCC, criou um mecanismo próprio de conseguir dinheiro para a manutenção do ecossistema criminoso. “Nenhuma apuração até hoje demonstra que a quadrilha carioca tenha a prática de tráfico de drogas fora da prisão, assim como faz o PCC, por exemplo. Eles agem, mesmo atrás das grades, com golpes de estelionato.” E a operação realizada pela Polícia Civil do RJ evidenciou que a quadrilha movimentou cerca de R$ 70 milhões em dois anos, promovendo a lavagem de dinheiro por meio de mais de 1.660 pessoas e 200 empresas. “Aqueles que são expulsos do PCC e Comando Vermelho são agregados ao Povo de Israel. O foco do bando é não criar ‘concorrência’ e poder continuar crescendo.”

O Estado do Rio de Janeiro inclusive bateu recorde de estelionatos entre janeiro e setembro deste ano, em relação ao mesmo período de 2023, conforme mostram os dados do Instituto de Segurança Pública (ISP). Foram 109.887 casos em 2024, o equivalente a um golpe a cada 3,5 minutos e 25% de aumento em relação ao ano anterior.