Ideia de construir o Museu da Democracia pode promover mais discórdia que pacificação

Por que um evento programado pelo Poder Executivo com apoio do Poder Judiciário não conseguiu animar número significativo de pessoas em todo o país? Flopou feio. Em Brasília, então, foi programado com pompa e circunstância. Nem assim vingou. Meia dúzia de gatos pingados protegidos por uma única tenda. Na Paulista, em São Paulo, um tiquinho de gente. Fato que tem ocorrido com frequência depois que os sindicalistas perderam a boquinha das contribuições obrigatórias. Até os mais entusiasmados não conseguiram dizer que havia além de algumas centenas de pessoas.  Sentindo que se comparecessem não teriam benefícios, a turma da ponta da pirâmide política preferiu ficar de fora. Quatorze governadores não deram as caras por lá. Arthur Lira (PP-AL), Presidente da Câmara dos Deputados, alegou motivo de saúde na família e “bateu faião”. Alguns deputados justificaram a ausência porque o evento foi idealizado pelo Poder Executivo. Marcaram presença a turma do PT e outros aliados, Zeca Dirceu (PT-PR), Isnaldo Bulhões (MDB-AL), Antonio Brito (PSD-BA). Ou seja, deu para contar nos dedos.

A explicação parece bastante óbvia. A população não entende que os atos repulsivos que vandalizaram os edifícios dos Três Poderes há um ano tenha sido uma tentativa de golpe. E essa não é apenas uma opinião, baseada no achismo. Não, essa constatação foi apresentada por estudos amparados na ciência estatística. Pesquisa feita pela Atlas/Intel divulgada no próprio dia 8, segunda-feira, mostrou que a narrativa governista, por mais que tenha tido apoio de grande parte da imprensa, não sensibilizou a população. De acordo com o resultado do levantamento, somente 18,8% dos entrevistados responderam que a tentativa de golpe existiu. Foram entrevistadas 1.200 pessoas entre os dias 7 e 8 de janeiro deste ano, época em que o assunto estava fervilhando nos meios de comunicação. Na verdade, os brasileiros não estavam sintonizados com essa conversa de “defesa da democracia”. “Defesa do quê?” Essa era a reação dos motoristas de taxi e das moças que colaboram com os trabalhos aqui em casa. Esses são bons termômetros. Quando um assunto corre de boca em boca, esse pessoal sabe explicar exatamente o que está acontecendo. Quando a matéria não vira, ninguém fala nada.

Indo contra essa maré, Lula anunciou que vai construir o “Museu da Democracia”. Parece que estou vendo a reação da turma: “Museu do quê?”. Essas “mandracarias” políticas são percebidas a distâncias incalculáveis. O que é pensado em Brasília com o objetivo de angariar benefícios político/ideológicos já na primeira esquina é desnudado. Tentativas de impor goela a baixo o que não encontra sentido ou ressonância na vontade do povo, como diria Jânio Quadros, morrem no cerce.  Não importa quais sejam suas cores partidárias, pense bem. Você vai visitar Brasília, faz um passeio por todos os pontos turísticos da cidade. Será que iria pedir ao guia para incluir no tour uma passada pelo “Museu da Democracia”?  Talvez o próprio profissional se surpreenda: “Museu do quê?”

O senador Hamilton Mourão foi um dos que criticou essa iniciativa do presidente da República: “40 milhões para o Museu da Democracia e o povo sem acesso à saúde. Esse é o desgoverno Lula. Amanhã teremos uma chanchada”. Muitos acham que em vez de unir os brasileiros em torno da causa democrática, esse museu poderia acirrar ainda mais a discórdia e a polarização. Temos de nos lembrar de que metade da população brasileira votou no ex-presidente Jair Bolsonaro. E essas pessoas, com certeza, não comungam dessa ideia. Questionam o que pode estar por trás dessas resoluções.  Seria, portanto, uma iniciativa que agradaria apenas aos governistas e um ou outro fora dessa bolha. Temos de considerar também que essas obras deveriam ser construídas para o país, e não para um governo de turno. E já que falamos em democracia, daqui a algum tempo poderá haver alternância de poder, e quem substituir aqueles que dirigem o país hoje, provavelmente, deixarão às moscas essa lembrança unilateral.

Entre as mais diferentes respostas obtidas pelo levantamento, o que importa para analisar a causa da baixa participação no evento é que menos de 20% das pessoas excluem a possibilidade de golpe. É muito significativo. Em cada dez pessoas, menos de dois acham que houve golpe. Se há uma causa que deva ser exaltada, celebrada, enaltecida é a democracia. A frase atribuída a Winston Churchill reverbera sempre que esse tema vem à tona: “A democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor que ela”. O duro é que ao longo da história quem mais afronta a democracia com suas ideias totalitárias são aqueles que mais dizem defendê-la. Siga pelo Instagram: @polito