Juíza que julga processo milionário no agro fez negócio de R$ 4 milhões com a empresa favorecida

Um processo na 1ª Vara Cível da Comarca de Sorriso, em Mato Grosso, está gerando polêmica não apenas pelo seu valor expressivo — superior a R$ 40 milhões —, mas também por possíveis conflitos de interesse que colocam em xeque a imparcialidade da juíza responsável. O titular desta coluna teve acesso à ação de execução, identificada pelo número 1003999-64.2025.8.11.0040, que foi movida pela Bertuol Indústria de Fertilizantes Ltda. (CNPJ: 05.644.974/0001-21) contra a SAFRAS Armazéns Gerais Ltda. e outros. O processo foi atribuído à magistrada Paula Saide Biagi Messen Mussi Casagrande.

Entretanto, o que poderia ser apenas mais um litígio comercial ganhou contornos preocupantes após a revelação de uma transação imobiliária entre a juíza e o empresário Juliano Luiz Bertuol, sócio da empresa que figura como autora da ação. De acordo com registros do Cartório de Registro de Imóveis local, a magistrada vendeu a ele, por meio da J. Bertuol Incorporadora Ltda., um imóvel de alto padrão no Condomínio Porto Seguro, avaliado em R$ 4 milhões. O fato de o comprador ser o proprietário da parte autora do processo sob julgamento pela própria juíza levanta questões sobre a integridade do procedimento.

Embora a transação imobiliária não seja ilegal, a natureza do negócio, o valor significativo e a ausência de qualquer declaração pública de suspeição levantam dúvidas sobre a isenção da juíza para decidir sobre uma causa que envolve diretamente seu recente comprador. Especialistas em direito destacam que o Código de Processo Civil, no artigo 145, incisos I e III, estabelece que o juiz deve se declarar suspeito se mantiver amizade íntima com uma das partes ou se tiver laços financeiros com elas. Relações comerciais recentes e de grande valor podem comprometer a confiança na imparcialidade judicial.

“A preservação da confiança no Poder Judiciário é fundamental”, afirma um professor de direito constitucional que preferiu não se identificar. “Quando uma juíza que está julgando uma ação milionária realiza um negócio de R$ 4 milhões com o proprietário da parte autora, é prudente que ela declare sua suspeição.” O imóvel, localizado em um dos condomínios mais luxuosos da cidade, evidencia ainda mais a ligação entre as partes envolvidas. Até o momento, não há registros de que a juíza tenha se manifestado sobre seu possível impedimento, e não houve solicitações de afastamento por parte do Ministério Público ou das partes do processo.

Esse silêncio é preocupante, especialmente considerando que decisões liminares em ações de execução podem levar a bloqueios patrimoniais imediatos e impactos diretos nas atividades empresariais. A aparente falta de imparcialidade pode comprometer a credibilidade do processo e abrir caminho para a contestação de futuras decisões. A ausência de transparência na condução do caso gera desconfiança e coloca em risco a integridade do julgamento. Além da transação imobiliária, outros fatores acentuam a percepção de parcialidade.

Documentos obtidos por esta coluna revelam:

  • Relação comercial recente: o negócio entre a juíza e o grupo Bertuol ocorreu pouco antes do ajuizamento da ação, o que fragiliza a noção de inexistência de um vínculo relevante.
  • Valor econômico da ação: o processo, que ultrapassa R$ 40 milhões, envolve ativos de grande relevância e repercussão financeira na região.
  • Conflito entre dever funcional e interesse privado: espera-se que juízes se abstenham de atuar em causas que envolvam pessoas com quem mantêm relações econômicas significativas.
  • Risco de favorecimento: mesmo que a juíza afirme estar pronta para julgar com imparcialidade, o próprio Poder Judiciário recomenda prudência e afastamento em situações que possam gerar dúvidas objetivas.

O caso da Bertuol não se limita ao mérito processual, mas levanta questões sobre a preservação do princípio da imparcialidade, um dos alicerces do Estado Democrático de Direito. Quando juízes realizam negócios substanciais com partes que têm interesse direto em processos sob sua supervisão, a confiança da sociedade no sistema judiciário é, sem dúvida, comprometida. O espaço da Jovem Pan está aberto caso Paula Saide Biagi Messen Mussi Casagrande queria se manifestar.