Leite: Proliferação de satélites transformará a visão de ‘OVNIs’ no ‘novo normal’

Marcelo Leite, diretor de estratégia da Sencinet, escreve sobre os reflexos da proliferação de satélites no comportamento e em telecom
Marcelo Leite, diretor de estratégia da Sencinet, escreve sobre os reflexos da proliferação de satélites no comportamento e em telecom

Por Marcelo Leite** – Já faz décadas que a ciência desestimulou as especulações sobre se “Eram os Deuses Astronautas”, usada como título do livro publicado em 1968 pelo escritor e arqueólogo suíço Erich von Däniken. Na obra, o autor trabalha com a hipótese de que os deuses descritos na literatura e nas escrituras sagradas das principais religiões e civilizações eram, na realidade, extraterrestres que alegadamente teriam visitado o planeta Terra no passado.

Após ser traduzido em 32 línguas e ter vendido mais de 63 milhões de exemplares, o livro passou a perder a credibilidade quando diversas evidências, alegadamente presentes nos achados arqueológicos, monumentos antigos, mapas e marcas intrigantes, começaram a ser cientificamente descartadas. Ainda assim, a possibilidade das visitas de alienígenas à Terra continua presente no imaginário coletivo e foi alimentada fortemente nos últimos dias quando autoridades de segurança de vários países se preocuparam e documentaram oficialmente a aparição de OVNIs (Objetos Voadores Não Identificados) em seus espaços aéreos.

Mas quando se observa com um pouco mais de profundidade o avanço da utilização da tecnologia de satélites de baixa órbita, pode-se tomar emprestada a pergunta de von Däniken e fazer uma pequena adaptação para indagar “Eram OVNIs os OVNIs?”.

Infelizmente, para os amantes da ficção científica, a resposta também neste caso afasta a hipótese de estarmos finalmente no “Ano em que faremos contato” com seres de outros planetas.

Na verdade, o mais provável é que a visualização de objetos aparentemente estranhos no céu se torne o novo normal com a ressalva de que não poderemos chamar essas visões de OVNIs porque elas serão totalmente identificadas como satélites de baixa órbita.

Estes equipamentos trazem como principal promessa a viabilidade da cobertura de banda larga a milhões de pessoas em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Isso porque, ao contrário dos chamados satélites geoestacionários (GEO), que ficam posicionados a uma distância de aproximadamente 36 mil quilômetros de distância da Terra, os de baixa órbita (LEO) operam entre 500 e 1.500 quilômetros e possibilitam utilizar dispositivos menores e mais baratos.

Essa menor distância permite uma viagem mais rápida dos dados, conhecida como latência. Considerando ainda que esses elementos transitam de forma mais ágil nas condições oferecidas pelo espaço (vácuo) do que nos cabos submarinos de fibra óptica, os satélites de baixa órbita são, juntamente com a tecnologia 5G, vistos como uma das tecnologias mais disruptivas dos próximos anos. Os maiores entusiastas chegam a apontar a possibilidade de a conexão por satélites de baixa órbita chegar ao ponto de estabelecer uma cobertura total da área do planeta com internet rápida e de qualidade.

Por essas e outras razões, a expectativa é de que nos próximos anos este tipo de satélite se multiplique de forma exponencial no espaço. De acordo com a Agência Espacial Europeia (ESA), a Terra já conta atualmente com cerca de 4.700 satélites ativos em sua órbita, mas este é só o começo. Muitas empresas, algumas mais midiáticas outras nem tanto, estão com planos em andamento para espalhar verdadeiras constelações de satélites num futuro bem próximo. A SpaceX, por exemplo, fala em ter mais de 40 mil, enquanto a Amazon, mais modesta, planeja colaborar com 3.200 e a startup Astra, com outros 13.600 satélites.

Além da menor altitude na qual permanecem, a razão de conseguirmos ver os satélites de baixa órbita é que, dependendo da posição de quem está olhando para o céu, pode vê-los pela reflexão da luz do sol. Normalmente são mais fáceis de serem vistos em áreas rurais do que em áreas urbanas por causa do excesso de luminosidade das cidades, e ao anoitecer ou antes do amanhecer.

Outra diferença em relação aos OVNIs é que os satélites seguem uma rota linear. Eles se movem em velocidade constante e nunca fazem movimentos bruscos. Podem ter alteração do brilho devido ao ângulo de reflexão da luz solar e da posição de quem o está observando. Algumas dessas características foram descritas nos relatos sobre as aparições celestiais dos últimos dias.

Todas essas informações podem tranquilizar os mais medrosos com a possibilidade de um combate contra seres de outras galáxias, mas infelizmente, aumentam as preocupações daqueles que se preocupam com o problema dos chamados detritos espaciais.

A mesma ESA trabalha com a informação de que circulam pela órbita da Terra, atualmente, ou seja, antes mesmo desta proliferação de satélites de baixa órbita, algo em torno de 36.500 pedaços de detritos com mais de 10 centímetros de largura. O crescimento veloz do já grande volume deste tipo de estrutura flutuando ao mesmo tempo aumentará significativamente o risco de choques entre eles mesmos ou com foguetes lançados para outras missões, que podem gerar consequências ainda incertas.

Seja como for, o novo normal dos OVNIs parece falar muito mais sobre a capacidade do homem de extrair o melhor uso dos recursos naturais com responsabilidade do que com os hábitos, interesses e possíveis super poderes dos extraterrestres.

** Marcelo Leite é Diretor de Estratégia e Portfólio na Sencinet

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