Low Code: presente e futuro

Responda com sinceridade: qual foi a última vez que você solicitou um desenvolvimento para a equipe de tecnologia (TI) e a sua demanda foi atendida rapidamente? Sempre ouço de parceiros que “a TI demora demais” ou “faz meses que espero um ajuste para uma funcionalidade do portal”. Como resultado, os fluxos de trabalho e a produtividade das áreas de negócios são prejudicados.

Tenho refletido sobre as razões pelas quais esse tipo de situação acontece para desenvolver soluções mais rápidas e integradas, uma vez que a tecnologia permeia e impacta diversas áreas de negócio.

Algumas das razões observadas são a falta de recursos disponíveis devido a conflitos de priorização, a digitalização de tudo, trazendo uma necessidade de tratar com artefatos tecnológicos o que antes era feito manualmente, a pressão por escalabilidade e a necessidade de geração de dados. A modernização dos negócios com base em dados, pressiona a digitalização de processos e coleta de informações fim-a-fim com um nível de riqueza cada vez maior.

Outro dia fiz um passeio por um dos pontos turísticos mais visitados do Mundo, na cidade em que nasci e cresci, o Rio de Janeiro, estava acompanhando um casal de amigos que nunca tinha visitado e me deparei com o controle de embarque para a tração feito manualmente em cadernos pelos responsáveis, funcionou, mas não gerou nenhum dado ou informação em tempo real para os gestores da atração, e a compilação dessas informações para analise futura será extremamente custosa, imagina “decifrar” nos cadernos utilizados, quantas pessoas embarcaram, para qual destino, em qual horário e por aí vai. Uma aplicação mobile com um QR code simples de leitura pelo próprio motorista no embarque já geraria uma riqueza de dados com benefícios extremamente palpáveis e rápido.

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É preciso considerar que não existe mais tecnologia sem negócio, nem negócio sem tecnologia. A transformação digital acelerada com a pandemia de COVID-19, foi e segue sendo o alicerce para aumentar o desempenho no backoffice e na operação das empresas, otimizar o tempo dos colaboradores, melhorar a experiência do cliente e, claro, conquistar resultados mais expressivos com maior governança.

Além disso, há um crescimento exponencial pela procura de talentos para a área de TI no Brasil. Estima-se que as empresas precisem de 797 mil profissionais de tecnologia, entre 2021 e 2025, porém apenas 53 mil pessoas são formadas a cada ano no País, segundo a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais. E é por isso que as empresas desse ramo têm investido tanto em programas de capacitação e atração de talentos. Ou seja, de um lado, pouca mão de obra. De outro, a necessidade crescente de modernização de aplicativos e novas soluções tecnológicas. Esse cenário traz a necessidade de equilíbrio entre as duas frentes.

É nesse contexto que o desenvolvimento low code (ou código baixo) surge como uma alternativa viável. A ideia é que colaboradores com pouca ou nenhuma experiência em programação de software possam criar e interagir com aplicativos nas áreas de negócio, sem depender da TI. O low code é ideal para aplicações que não têm prioridade no backlog da TI, mas são essenciais para os departamentos, como aplicações que precisam ser feitas de forma rápida; integração online com outros sistemas, como CRM; e aplicações para substituir planilhas e portais que nasceram simples e se tornaram complexos dentro das áreas.

Outra contribuição é substituir processos descentralizados, como mensagens de WhatsApp e grupos de e-mails para recebimento de informações e planilhas compartilhadas na rede. O ambiente low code traz segurança e governança de dados para esse tipo de comunicação, uma vez que está parametrizado dentro das regras da Lei Geral de Proteção de Dados.

A grande sacada é que as ferramentas de código baixo são fáceis de serem utilizadas, pois empregam técnicas visuais de arrastar e soltar (drag and drop) sem a necessidade de escrever sequer uma linha de código. As regras são amigáveis e as funcionalidades de execução simples, com assistentes de importação de planilhas, estúdios de criação, edição de workflows e uso de templates. Costumo dizer que é como um game.

Aliás, não é à toa que vários jogos de sucesso são desenvolvidos em low code, a exemplo do Minecraft. Crianças e adolescentes já exploram com maestria esse ambiente e querem mais. Basta acompanhar a ampla oferta de cursos nas escolas infantis especializadas em programação. Possivelmente as empresas que não disponibilizarem as plataformas de código baixo como suporte básico de trabalho dificilmente conseguirão reter os profissionais do futuro.

Mas o low code está acontecendo agora e a boa notícia é que as pessoas já estão abertas ao uso desse tipo de solução. A geração Millenial (nascidos a partir da década de 1980), que hoje compõe a maior parte da mão de obra ativa no mercado, nasceu no mundo analógico, porém cresceu experimentando os primeiros dispositivos móveis e tendo acesso rápido à informação e a vários avanços tecnológicos. Já os colaboradores da geração Z (nascidos a partir de 1995) têm uma relação ainda mais íntima com a tecnologia – ela já faz parte da sua lógica de trabalho. Acostumados com smartphones, WhatsApp e redes sociais, têm facilidade de aprender e são adeptos de ferramentas de colaboração online e aplicativos corporativos customizados.

Assim, o desafio atual é converter a força de trabalho que ainda tem pouca familiaridade com a tecnologia low code. É natural essa curva de aprendizado e os líderes têm um importante papel em estimular as equipes.

A transição do desenvolvimento tradicional para o low code é uma realidade como aponta o estudo The Journey to Cloud Sovereignty, da Capgemini e vem sendo adotada por indústrias como energia, serviços públicos, educação, bancos, seguros, mídia e entretenimento, varejo, manufatura e saúde, entre outras.

O mercado global de tecnologias low code deve movimentar US$ 26,9 bilhões em 2023, um aumento 19,6% comparado a 2022. Até 2024, 80% dos produtos da tecnologia serão feitos por profissionais que não são técnicos, e 65% deles, em plataformas low code, segundo o Gartner. Já o relatório da ResearchAndMarkets aponta crescimento acelerado do mercado global de plataformas low code. Nesta década, a previsão é que o segmento gere uma receita de US$ 187 bilhões.

É importante dizer que o low code não resolve todos os problemas de desenvolvimento de software de uma organização, nem significa o fim da codificação tradicional. As áreas de tecnologia continuarão tendo sempre sua importância, especialmente focadas no core do negócio. O low code vem para somar, proporcionando mais agilidade para automatizar processos e suportar o lançamento de produtos digitais. As áreas de negócios serão capazes de montar e personalizar os aplicativos corporativos para otimizar seus fluxos de trabalho e suas necessidades fora do core da organização, com controle e governança de dados.

Chegou a hora de transformar obstáculos em oportunidades.

* Guilherme Duarte é diretor de parceria estratégica da Capgemini com a ServiceNow Brasil