O fim previsível de Olaf Scholz

Desde as últimas eleições alemãs em 2021, poucas pessoas acreditavam que o pouco carismático Olaf Scholz, do Partido Social-Democrata, poderia vencer e se tornar chefe de governo da maior economia da Europa. Após erros sucessivos dos conservadores da CDU e a escolha do também pouco carismático Armin Laschet para suceder Angela Merkel, o partido mais tradicional da direita alemã se viu isolado, perdendo 49 assentos no parlamento e o poder depois de 16 anos. Com isso, os sociais-democratas, liberais e os verdes formaram uma coalizão governista chamada de semáforo, em virtude de suas cores vermelha, amarela e verde, uma composição inédita na Alemanha pós-guerra e que colocaria muitas pautas contrastantes em teste ao se buscar estabilidade.

Enquanto os sociais-democratas e verdes se preocupam cada vez mais com as pautas ambientais e identitárias, realizando uma política migratória enfadonha, os liberais, mais preocupados com as pautas econômicas, aceitaram navegar em conjunto em troca de alguns ministérios e propostas ouvidas, principalmente com a liderança de Christian Lindner como ministro das finanças. Por três anos e meio, apesar das divergências claras em muitas agendas internas, a coalizão do semáforo, ou em alemão Ampelkoalition, sobreviveu aos desafios de um mundo pós-pandemia, o início de uma guerra na Europa e a estagnação econômica alemã do último ano. Com eleições marcadas para setembro de 2025, tudo parecia não ir tão bem, mas seguir de forma relativamente estável por mais alguns meses, até que o chanceler Olaf Scholz decidiu demitir o ministro das finanças Lindner, culminando com a debandada dos liberais do seu governo, o fio sustentador de sua maioria frágil no parlamento. 

Enquanto espera um voto de confiança perante o Bundestag em breve, Scholz sabe que as possibilidades da queda completa de seu governo são grandes, e muitos na Alemanha cogitam eleições antecipadas já para março de 2025, seis meses antes do previsto. Mesmo sendo uma crise política nova, a permanência de Scholz como chefe de governo já tinha os seus dias contados na visão da ampla maioria dos alemães, considerando que o partido do chanceler, que fez mais de 25% em 2021, não pontua bem nas pesquisas, estacionado em singelos 16% há meses, de acordo com as intenções de voto. Seus parceiros de coalizão, os verdes, também caíram, estagnados na faixa de 12% do eleitorado, enquanto os conservadores clássicos da CDU/CSU ultrapassam os 35% e têm grande chance de levar a próxima eleição e a chancelaria para a direita, seja ela em março, seja em setembro de 2025.

A queda de Scholz, por mais que fosse previsível, revela um aspecto decepcionante da mudança brusca de direção do clássico Partido Social Democrata alemão, tendo sido a maior voz de centro-esquerda de toda a Europa e conquistando muitos louros dentro da República Federativa Alemã em 70 anos. A SPD, assim chamada internamente, foi fundamental para unificar o sistema educacional alemão, dar acesso às universidades ao maior número de pessoas, além de pavimentar um caminho sólido para leis trabalhistas justas que tornassem a Alemanha uma potência industrial ao mesmo tempo que mantinha a dignidade dos operários. Depois de ícones da social-democracia como os chanceleres Willy Brandt e Helmut Schmidt, o partido se perdeu em sua essência e se descolou da realidade da classe média trabalhadora, sua mais fiel base há mais de 100 anos.

A ascensão de Olaf Scholz à presidência do partido e outros nomes fracos para a liderança interna apenas fizeram com que a base histórica de eleitores da SPD mudasse seus votos e procurasse alternativas na direita. Assim como o partido democrata nos Estados Unidos, a SPD sequestrada pelas pautas identitárias e por uma política migratória falha, se tornou o partido das elites econômicas e intelectuais da Alemanha e deixou de ser um partido popular da classe média, que busca como prioridade moradias dignas e empregos estáveis. O tom monocórdico do chanceler Scholz, sua postura fraca perante outros líderes europeus e mundiais, além de sua cambaleante postura em assuntos importantes internamente, fez com que a sua presença na chancelaria se tornasse naturalmente insustentável. Hoje, em meio a essa crise em andamento, ainda é cedo dizer quando Scholz partirá, mas podemos falar, com alto grau de precisão, que sua saída não deixará saudades.