STF decide se pulverização aérea será proibida

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou na última semana o julgamento que vai definir se é constitucional ou não a pulverização aérea de agroquímicos no Ceará. Essa ação foi ajuizada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que questiona uma lei que que proibiu a pulverização aérea no estado. O julgamento desse tema já tinha começado e ficou parado depois que um dos ministros da Corte pediu mais tempo para analisar o tema. Confira entrevista com o consultor jurídico da CNA, Rodrigo Kaufmann.

A expectativa da CNA é que o STF autorize a pulverização aérea no Ceará? Nós alegamos na nossa Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) a inconstitucionalidade dessa lei do estado do Ceará. Acreditamos que ela tem dupla inconstitucionalidade. Em primeiro lugar é o da competência, porque é uma competência da União, pois temos autorização para pulverização aérea no país inteiro, é uma atividade regulamentada e fiscalizada pelo Ministério da Agricultura, Anac, Ministério Público e todos os órgãos ambientais. Então nós acreditamos que de fato estamos diante de uma inconstitucionalidade formal. E, além disso, uma inconstitucionalidade material, exatamente porque a atividade em si faz parte do tipo de planejamento que se tem numa agricultura profissional, que calcula os custos e que oferece produtos com preços adequados. Nossa expectativa é que sim, o STF vai entender no final que esta lei é inconstitucional e que as demais leis, e hoje temos algumas leis municipais que mais ou menos seguem esse caminho, vão ser declaradas inconstitucionais.

Alguns ministros já se manifestaram sobre o tema? Com base em que você afirma que o STF deve se posicionar favorável à manutenção da pulverização aérea? O julgamento foi retomado, nós estivemos na primeira sessão de julgamento deste caso, que foi lá em novembro de 2021, o voto da ministra Cármen Lúcia e do ministro Edson Fachin pela constitucionalidade da lei e pela improcedência desta ação[da CNA]. E já tivemos o voto do ministro Gilmar Mendes, que acompanhou a relatora. A nossa surpresa foi que o voto do Gilmar Mendes veio sem um apanhado mais consistente sobre sua posição, ele apenas acompanhou a ministra Cármen Lúcia.

Nós estivemos argumentando, apresentando dados para todos os ministros do STF, mas ainda acreditamos que neste caso especificamente nós vamos ultrapassar essa fase de falta de conhecimento sobre como se dá efetivamente a atividade de pulverização aérea no Brasil inteiro. Estamos falando de uma atividade, talvez uma das mais profissionais que temos, uma atividade que contribui, inclusive, para os preços que temos dos produtos serem adequados no mercado nacional e internacional. Nossa expectativa é que os outros ministros talvez entendam desta maneira, pela inconstitucionalidade dessa lei [do Ceará].

Se o STF decidir pela proibição da pulverização, essa decisão pode ser estendida para outros Estados brasileiros? Nós temos no STF a tramitação de uma ADPF, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, que trata dessa questão também relacionada que questiona as leis municipais. Nós imaginamos que esta ação traz mais informações sobre a regularidade dessa atividade e o fato é que ela não oferece qualquer risco, qualquer perigo à saúde humana e muito menos à saúde ambiental dos ecossistemas. Então, essa decisão do STF sobre a Adin de fato preocupa devido ao encaminhamento que está sendo dado a ela. E, de fato, seria um sinal ruim para a liberdade de regulamentação nos outros Estados. Mas nós imaginamos que esse assunto vai ser resolvido por meio do julgamento das duas ações.

O que nos chama a atenção é o voto da ministra Cármen Lúcia, que levanta preocupações do setor agrícola brasileiro de proteção ao meio ambiente, mas não se dedica ao enfrentamento dos argumentos que foram levantados na Adin. Por exemplo, o de que a aviação agrícola brasileira se estabelece num mercado hipercompetitivo, é uma atividade que é fiscalizada por vários órgãos federais, estaduais e também municipais. Nós contamos com a atividade altamente tecnológica, então a aplicação do defensivo agrícola se dá com precisão, é o tipo de pulverização que nós não temos quase o perigo da deriva. Os aviões são munidos de fluxômetro, de um GPS especial, quer dizer, todos os instrumentos que temos para garantir que não vai haver qualquer tipo de dano ao meio ambiente nós temos no mercado de pulverização no Brasil. Esses são fatos que não foram enfrentados nos votos apresentados até agora.

Se o STF entender que o Ceará fez certo e tem que proibir a pulverização aérea, qual o efeito prático que isso geraria em outros estados? Esta Adin trata especificamente da lei do Ceará, e se for declarada a constitucionalidade, a pulverização aérea fica proibida lá. O que o Supremo está dizendo na sua decisão é que os Estados poderiam regular essa matéria, proibindo também a pulverização aérea, esse é o sinal. Isso não teria efeito imediato, apenas indica que a competência do Estado em matéria do meio ambiente permite a eles proibirem a pulverização aérea. Este é o motivo da preocupação.

Existe um movimento em outros Estados com projetos de lei que também proíbem a pulverização aérea? Nós fazemos o monitoramento em alguns Estados, esses projetos de lei não seguem adiante. Mas, infelizmente, no Brasil existem lei municipais que proíbem a pulverização aérea e essas lei foram objetos de uma ação específica da CNA que questiona a constitucionalidade delas, parte em relação à competência formal, pois alegamos que só a União tem poder de eventualmente proibir essa atividade, e parte em relação à competência material, ou seja, os produtores rurais têm a liberdade para definir este tipo de pulverização, obviamente observando as limitações que a lei federal estabelece.

Quando vamos saber a decisão final do STF sobre esse tema? O julgamento está se dando por meio de uma sessão virtual, ela foi reaberta na sexta-feira e continua até a quinta-feira desta semana. Até lá, se nenhum outro ministro pedir vista, teremos uma decisão definitiva desse assunto.