“Desenvolver tecnologia sem respeito à privacidade não deveria ser opção”, afirma Dra. Patrícia Peck
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Nos últimos anos, a privacidade deixou de ser apenas uma preocupação marginal para se tornar um dos pilares do debate sobre tecnologia e regulação. No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), sancionada em 2018, consolidou direitos e responsabilidades sobre o tratamento de informações pessoais. Globalmente, mais de 100 países possuem legislações sobre o tema, mas a aplicação dessas normas ainda enfrenta desafios.
Em entrevista ao IT Forum, a Dra. Patrícia Peck, especialista em direito digital e CEO do escritório Peck Advogados explica: “Estamos num processo de formação de uma cultura empresarial que incorpora o conceito de privacy by design, ou seja, a privacidade deve ser integrada desde a concepção de produtos e soluções tecnológicas”.
Atualmente, a privacidade é uma exigência legal e um direito fundamental, inserido na Constituição Federal do Brasil. Segundo dados da ONU, mais de 100 países já legislaram sobre o tema, consolidando a privacidade como um direito essencial da sociedade digital.
Privacidade e inovação: barreira ou diferencial?
A decisão recente da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) de suspender a coleta de dados biométricos pela World no Brasil reacendeu a discussão sobre o futuro da privacidade. O projeto, que trocava escaneamentos de íris por criptomoedas, foi criticado pelo direcionamento a populações vulneráveis. Para especialista, esse caso reforça a necessidade de regulamentação mais clara e fiscalização rigorosa.
Para garantir um futuro sustentável, a tecnologia precisa ser segura e alinhada com princípios ESG. “Privacidade e segurança da informação devem caminhar juntas, tornando-se diferenciais competitivos no mercado”, afirma a advogada. Empresas que abrem capital ou possuem investidores precisam demonstrar conformidade com esses princípios, pois a privacidade é um direito humano.
No entanto, muitas soluções tecnológicas ainda tratam a privacidade como um obstáculo, e não como um diferencial de qualidade. “Ainda há empresas que sequer têm um DPO nomeado ou uma política de privacidade bem definida”, aponta.
Para ela, o futuro deve trazer certificação de soluções com selos de conformidade, permitindo ao consumidor identificar facilmente quais serviços respeitam a privacidade e a segurança.
O impacto econômico da privacidade
Outro ponto importante é o papel do seguro cibernético, que pode mitigar os impactos financeiros de incidentes de segurança. Globalmente, o mercado de seguros cibernéticos também apresentou expansão. Em 2024, estima-se que o mercado tenha alcançado US$ 16,09 bilhões, com projeções de atingir US$ 39,58 bilhões até 2029, segundo levantamento da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).
“A grande questão é: a privacidade está se tornando uma moeda tão cara que pode inviabilizar certas tecnologias?”, questiona. Se for esse o caso, ela acredita que pode ser necessário um debate legislativo para equilibrar a proteção de dados sem comprometer a inovação ou os direitos fundamentais.
Segundo Patrícia Peck, há um cenário de insegurança jurídica: leis existem, mas muitas vezes são ignoradas por parte da indústria, o que expõe empresas e consumidores a riscos. Fiscalizações podem resultar em multas pesadas ou até na suspensão de operações inteiras.
“Imagine uma tecnologia amplamente utilizada que, de repente, é banida por não atender aos padrões de segurança e privacidade. A sociedade precisa entender que privacidade e segurança são elementos essenciais de qualidade dos produtos digitais”, reforça a especialista.
Inteligência artificial e o desafio da privacidade
O avanço da inteligência artificial traz novos dilemas para a privacidade. Recentemente, o editor do IT Forum, Rafael Romer, entrevistou Rodrigo Tozzi, chefe de Operações da Tool for Humanity no Brasil, que afirmou que, na era da IA, a privacidade precisa ser revista. Para Patrícia Peck, essa visão empresarial enxerga a privacidade como um entrave, e não como um pilar de qualidade.
“Estamos caminhando para uma sociedade inteligente, com IA embarcada em todas as áreas, mas isso não significa que abrimos mão da privacidade”, afirma a advogada. “A proteção de dados pessoais é um direito fundamental, pois está ligada à identidade e à dignidade humana.”
Para ela, sem essa proteção, podemos enfrentar um futuro onde IAs utilizarão imagens e dados de pessoas sem consentimento, agravando desafios já existentes, como fake news e deepfakes.
O paralelo com outras indústrias
A especialista traça um paralelo entre a regulação da privacidade e outras indústrias. “Assim como não podemos fabricar alimentos sem atender às normas de segurança e saúde, também não deveríamos desenvolver tecnologia sem respeitar a privacidade”, compara.
Indústrias que ignoraram a saúde dos consumidores no passado, como a do tabaco, pagaram um preço alto por isso. “O mesmo pode acontecer com a indústria de tecnologia se ela continuar negligenciando a privacidade e a segurança de dados”, alerta.
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