Trump redefine política de exportação de chips de IA e gera altos riscos

Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, em destaque. Ele está usando um terno azul escuro, camisa branca e gravata vermelha, com uma expressão séria e olhar fixo. Ao fundo, há um padrão desfocado em EUA vermelho, branco e azul, remetendo às cores da bandeira americana. A imagem transmite formalidade e autoridade (ordem executiva, ações)

Durante uma missão diplomática e comercial ao Oriente Médio nesta semana, o presidente Donald Trump deu sinal verde para a exportação de centenas de milhares de chips de inteligência artificial (IA) fabricados nos Estados Unidos para empresas da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos (EAU). A iniciativa marca uma guinada radical na política americana sobre o controle e a distribuição dessa tecnologia estratégica, antes vista como um ativo nacional a ser rigidamente protegido.

Até recentemente, os EUA vinham impondo restrições severas à exportação de chips de IA mais avançados, com foco especial em evitar que eles chegassem a países considerados rivais ou ameaças à segurança nacional. Agora, Trump está transformando esses chips em peças-chave de sua diplomacia econômica, usando-os como moeda de troca para obter concessões comerciais e fortalecer alianças no mundo árabe.

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Chips de IA viram moeda geopolítica

O anúncio mais simbólico aconteceu durante o Fórum de Investimentos EUA-Arábia Saudita, em Riad, onde Trump participou de uma série de encontros com líderes da região. No evento, a Casa Branca anunciou que a Arábia Saudita se comprometeu com investimentos de US$ 600 bilhões em território americano, destacando o início de “laços econômicos que durarão gerações”.

Na mesma conferência, o CEO da Nvidia, Jensen Huang, revelou uma nova parceria com a Humain — startup controlada pelo fundo soberano saudita — que prevê o envio de centenas de milhares de chips da empresa para a região. A concorrente AMD também anunciou um projeto de US$ 10 bilhões no país. Outro acordo em andamento pode levar uma quantidade similar de chips para a G42, gigante de tecnologia com sede nos Emirados Árabes.

A escala dos negócios é impressionante. “Estamos falando de algo maior do que qualquer sistema de treinamento de IA existente no mundo atualmente”, afirmou Alasdair Phillips-Robins, pesquisador da Carnegie Endowment for International Peace. Ele alerta que os modelos criados com esses chips poderiam ser usados em operações automatizadas de espionagem, desenvolvimento de armas e ciberataques — um risco que preocupa especialistas em segurança dos EUA.

Especialistas alertam para riscos à segurança nacional

Para Janet Egan, pesquisadora do Center for a New American Security (CNAS), a decisão de usar chips de IA como peça de barganha comercial representa um erro estratégico. “Esses chips sustentam a liderança dos EUA em IA. Não podemos tomar decisões de curto prazo que ponham em risco essa vantagem no longo prazo”, afirmou.

A preocupação não é infundada. No início deste ano, a empresa chinesa Deepseek revelou ter desenvolvido um modelo de IA avançado usando majoritariamente chips Nvidia obtidos antes de 2023 — ano em que a administração Biden fechou uma brecha nas regras de exportação. A revelação aumentou a pressão por controles mais rígidos.

Nas últimas semanas doscrevendosi seu mandato, Biden intensificou essas restrições, com foco em países do Golfo. No entanto, a administração Trump rapidamente anulou essas medidas, classificando-as como “burocráticas e excessivamente complexas”. Em vez disso, adotou uma abordagem baseada em negociações bilaterais: cada país poderá ter acesso a chips de IA de acordo com sua disposição em fazer concessões comerciais.

Oriente Médio quer liderar a era da IA

Os países do Golfo vêm investindo pesado para se tornarem protagonistas na revolução da IA. Com vastas reservas de energia, capital abundante via fundos soberanos e pouca interferência regulatória, a região tem apostado em projetos ambiciosos de infraestrutura e tecnologia. O que faltava, até agora, era o acesso aos chips mais avançados do mundo — fabricados por empresas como Nvidia e AMD.

Esse obstáculo acaba de ser removido. Com o apoio de Trump, os governos do Golfo finalmente terão acesso à tecnologia necessária para treinar modelos de IA em escala massiva. Mas esse avanço levanta suspeitas em Washington, especialmente devido às conexões entre algumas dessas empresas e a China.

Em anos anteriores, agências de inteligência dos EUA alertaram que a G42 poderia funcionar como canal para transferência de tecnologia americana à China — acusação que a empresa nega com veemência. Ainda assim, os laços entre os países despertam temores sobre como esses chips poderão ser usados e quem, de fato, terá controle sobre os sistemas desenvolvidos.

“Se pensarmos em qual país deveria liderar o futuro da tecnologia mais crítica e transformadora que já vimos, com certeza não escolheríamos regimes autoritários e não democráticos”, afirmou Egan.

“America First” ou “offshoring” estratégico?

A decisão também levanta críticas entre aliados do próprio Trump, que veem contradições com o discurso de “America First” que marcou sua primeira passagem pela Casa Branca. Para Sam Winter-Levy, também da Carnegie Endowment, essa nova política pode incentivar empresas americanas a migrarem suas operações para o Golfo, onde terão acesso à energia mais barata, menos regulações e maior apoio governamental.

A Scale AI — startup que colabora com o governo americano em padrões de segurança para IA — já anunciou planos para abrir um escritório na Arábia Saudita. Google e OpenAI também estão expandindo suas presenças na região. Para Winter-Levy, isso pode criar uma dependência perigosa.

“É possível que uma grande parte da capacidade computacional dos EUA seja terceirizada para países que, no futuro, poderão usar essa alavancagem para influenciar a política externa americana”, alerta.

Segundo ele, os novos acordos contradizem a promessa de priorizar a indústria nacional: “Estamos terceirizando centros de dados que poderiam ser construídos em solo americano. Chips que poderiam estar fortalecendo nossas empresas estão indo para o exterior. É difícil conciliar isso com qualquer política industrial genuinamente nacionalista.”

*Com informações da Time

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