Um novo tipo de liderança

O antônimo de frágil, para você, seria robusto, permanente, resistente ou inquebrável? Nassim Nicholas Taleb, autor do livro Antifrágil: coisas que se beneficiam com o Caos, discorda de todas essas palavras – e na falta de uma que realmente representasse o que ele gostaria de falar, criou uma: Antifrágil. De acordo com a sua obra, a antifragilidade não se resume à resiliência ou à robustez. O resiliente resiste a impactos e permanece o mesmo, enquanto o antifrágil fica melhor.

“Essa propriedade está por trás de tudo o que vem mudando com o tempo: a evolução, a cultura, as ideias, as revoluções, os sistemas políticos, a inovação tecnológica, o sucesso cultural e econômico, a sobrevivênciadas empresas, as boas receitas (por exemplo, sopa de galinha ou steak tartare com uma gota de conhaque), o surgimento de cidades e culturas, os sistemas jurídicos, as florestas equatoriais, a resistência bacteriana… até mesmo a nossa própria existência
como espécie neste planeta.”

Nycholas Szucko, diretor de vendas regional da Nozomi Networks e especializado em liderança antifrágil, complementa ao dizer que resiliente é, por exemplo, uma chapa de aço que, mesmo que você bata, não quebra. Ou uma palmeira que, quando há uma ventania, ela se enverga, mas volta ao mesmo lugar, sem criar um design melhor para a próxima vez que tiver vento. O conceito de antifragilidade é como Hidra de Lerna na mitologia grega. Ela tinha várias cabeças de serpente e algumas versões da lenda dizem que, quando uma cabeça era cortada, nasciam duas no lugar. Ou seja, cada vez que se encontrava em uma situação de choque, ela se tornava mais forte.

NYCHOLAS ZUCKO, DA NOZOMI

Para tornar-se um líder antifrágil, é necessário olhar para diversidade. “O gênero, onde nasceu, seu idioma, cresças e culturas mudam a sua percepção de mundo. Então, ao ter tudo isso dentro de uma corporação, há mais chances de ter vários pontos de vista em desafios maiores e, por consequência, mais chances de crescer e aprender”, explica Nycholas.

Ainda assim, olhar para as pessoas em primeiro lugar pode ser um desafio para os líderes. Em alguns momentos, será necessário abrir mão do resultado para gerar essa nova estratégia a longo prazo. Se um executivo fala que seus pilares são, nessa ordem: resultados da empresa, colaboradores e clientes, fica claro que a sua prioridade não são as pessoas.

PILARES DA LIDERANÇA ANTIFRÁGIL

Intervencionismo ingênuo: Se você não sabe as consequências que virão de uma intervenção, melhor não fazer

Ao querer agradar um público um uma classe, tomam-se medidas que não são observadas no longo prazo. Um exemplo dado por Nycholas, foi uma ação do governo há alguns anos de diminuir os impostos para a compra de caminhões – visando agradar os caminhoneiros.

Com isso, empresas e pessoas que não eram da área passaram a comprar os automóveis para depois vender e ter lucro. Em consequência, houve muita demanda para os prestadores de serviços e não tantos benefícios para o público original.

“Às vezes, a melhor coisa a ser feita, se você não sabe realmente o impacto que o resultado vai gerar, é não fazer nada. Lógico que não é necessário ficar estudando eternamente e não fazer nada. O intervencionismo ingênuo sempre terá o contexto além de tudo. Não faz movido pela emoção”, comenta ele.

Efeito Lindy: o que já se provou no teste do tempo

Aqueles que estão há mais tempo no mercado, têm mais chances de continuar crescendo. Um exemplo dado por Nycholas para entender o conceito é: em uma casa de show em Nova York, os humoristas que já se apresentavam há cinco anos no local tinham mais chances de estar lá nos próximos cinco anos do que aquele que se apresentou pela primeira vez voltar no dia seguinte.

“Outro exemplo: se você olhar o best-seller de hoje, você saberá se os seus netos o lerão? Mas nós temos quase toda a certeza de que as pessoas vão ler O Pequeno Príncipe ou A Arte da Guerra em qualquer momento da nossa história”, diz ele. O especialista alerta aqueles que estão em jornada inicial, que precisam ter muito cuidado para não desaparecer. Por outro lado, aqueles que já estão estabelecidos precisam ter atenção para manter-se conectados para garantir essa perpeituidade.

Estratégia Barbell: investimentos com inteligência

De acordo com o conceito da liderança antifrágil, 90% do investimento deve ser feito no básico benfeito e 10% em tecnologias disruptivas para proteção das “joias da coroa”. Fazendo um paralelo com investimentos pessoais, 90% do dinheiro estaria em investimentos menos agressivos para não colocar o patrimônio de uma família em risco.

“Ou seja, 90% do meu investimento deve estar em segurança. Mas eu posso pegar 10% para começar a encubar empresas ou criar áreas de inovação. Pode ser que, daqui a uma década, essa área que você investiu 10% será a que trará 90% do seu dinheiro”, diz Nycholas.

Conceito da Via Negativa: adicionar subtraindo

Melhor do que agir em excesso, é agir pela via negativa. Ou seja, a Via Negativa acontece ao remover o que se acredita estar errado. O conhecimento negativo (o que está errado, o que não funciona) é mais robusto ao erro do que o conhecimento positivo (o que é certo, o que funciona).

Um exemplo usado no livro Antifrágil: coisas que se beneficiam com o caos é o de Michelangelo. Ao se discutir Davi, ele dizia: “Eu tirei o que não era Davi e ele apareceu”. Ou seja, a empresa se beneficiará de tirar o excesso.

Skin de game: ter “pele no jogo”

Se um conselheiro de investimento mandou alguém comprar uma ação, mas ele mesmo não está investindo nessa ação, como é possível confiar nesse conselho? “No Skin de Game, todo mundo está na jornada, desde o presidente até o estagiário”, frisa o especialista.

Liderança ambidestra: outro ponto de vista

Ainda que não seja um termo difundido entre todas as organizações, a liderança ambidestra é essencial para aqueles que acreditam ser ou desejam se tornar inovadores. Segundo a definição de Renata Barcelos, professora associada da Fundação Dom Cabral, ser uma empresa ambidestra significa ter a capacidade de inovar ao mesmo tempo em que opera de forma eficiente — ou, simplesmente, econômica — a ponto de conseguir atingir as metas financeiras e operacionais no curto prazo ao mesmo tempo em que se maximiza valor no longo prazo.

RENATA BARCELOS, DA FDC

Projetar tal tipo de empresa passa, primeiramente, pela definição de uma estratégia ambidestra, ou seja, pela premissa de que a processos inovativos devam fazer parte do DNA da empresa, mesmo que produtos, serviços e mercados consolidados continuem tendo sucesso no curto prazo. “Ambidestria é a capacidade das empresas de trabalhar com dois modelos ao mesmo tempo: buscar uma lógica de inovação e pensamento de longo prazo ao mesmo tempo que ela cuida do curto prazo e da geração de valor nesse curto prazo.

Essas lógicas são concorrentes, porque as dinâmicas são muito distintas. Quando falamos de inovação, falamos de incerteza, tomada de riscos, testes. Quando a
gente busca de eficiência em curto prazo, está falando de cuidar da vaca leiteira, de algo que eu já sei que funciona”, resume a especialista.

Para ela, os maiores desafios para a liderança ambidestra são culturais. “Porque são mindsets diferentes, são lógicas muito diferentes. O que a gente tem trabalhado atualmente é a opção de criar estruturas para cuidar da inovação, a gente cria pelo menos um comitê ou área de inovação para cuidar dessa lógica e não ficar concorrendo com os recursos utilizados em curto prazo. Senão as pessoas tendem a cuidar do que está funcionando.”

Ao comentar a relação com a liderança antifrágil, Renata diz que esse poderia ser o modelo ideal por motivar as pessoas a buscarem sempre ser melhores. É um sistema que inspira e dá coragem para sair melhor de uma situação adversa e faz sentido pela lógica do aprendizado. “Uma organização que aprende é aquela que toma o impacto, trata e quando aprende, já sai melhor por natureza. É uma teoria que poderia ser entendida simplesmente como aprendizado organizacional”, contrapõe.

Cada vez mais, a tecnologia torna-se um pilar para a inovação. Hoje, vivemos em um momento histórico em que a transformação digital é inescapável. Ao falar de inovação, a tecnologia vem ao lado e complementa as soluções. Não há mais como pensar em inovação e não entender como ela entra em um sistema digital ou em um ecossistema que seja potencializado pelas soluções digitais. Ainda assim, andam juntos a estratégia, pessoas e processos.

“Para se tornar um líder ambidestro, ele precisa entender o que é a ambidestria de fato. Ver o que as grandes empresas estão fazendo. Você explora algo novo e explota aquilo que eu já tenho. Quando você pega os movimentos de exploração e explotação das empresas de tecnologia, que estão fazendo a diferença no mundo, você vê o ritmo de investimento, o grau de risco que essas empresas estão abraçando”, aconselha Renata.

Em seguida, há duas lógicas: empresas mais tradicionais precisam trabalhar o lado da inovação porque elas são mais fortes nas capacidades de eficiência. Ela precisa entender que a inovação tem que fazer parte e entender que terá risco. Ela vai ter que aprender a lidar com a incerteza e com os próprios erros. O risco da inovação e o risco da não inovação – porque isso passa a ter tanto risco do que inovar.

Por último, de acordo com a especialista, é preciso entender que não vai fazer sozinho. Não vai ser uma grande ideia de um líder, é preciso trabalhar em time, é preciso aprender a colaborar, às vezes com quem está fora, com quem parece que é um concorrente. Aprender que as grandes soluções não vão partir de
uma cabeça só.