Um pedido de anistia aos manifestantes de 8 de Janeiro

Foi protocolado o requerimento de urgência ao projeto de lei que visa anistiar os condenados que se manifestaram e depredaram prédios públicos em 8 de Janeiro. Foi de lavada: 264 assinaturas! Eram necessárias 257. A intenção do líder do PL (Partido Liberal) na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcante (RJ), era conseguir ao menos 280 assinaturas para demonstrar como a Casa estava unida na defesa desse projeto. Diante das pressões feitas pelo governo para que os deputados da base desistissem do apoio, Sóstenes resolveu mudar a estratégia e protocolar com o número que tinha em mãos, para evitar surpresas.
Esse foi só o primeiro passo
A caminhada será longa. Depois de ser aprovada na Câmara, a proposta percorrerá um extenso trajeto, passando pelo Senado, possíveis vetos presidenciais, até chegar ao STF, que dará a palavra final sobre sua constitucionalidade.
Hugo Motta, presidente da Câmara, contrariando seu discurso inicial, agora tenta caminhar por um consenso que possa satisfazer os três Poderes, já que a iniciativa dos deputados é vista como afronta ao STF (Supremo Tribunal Federal).
O discurso inicial foi um
Em 7 de fevereiro deste ano, durante entrevista à rádio Arapuan FM, de João Pessoa, Motta afirmou: “O que aconteceu não pode ser admitido novamente, foi uma agressão às instituições. Agora, querer dizer que foi um golpe… Golpe tem que ter um líder, uma pessoa estimulando, tem que ter apoio de outras instituições interessadas. E não teve isso.”
Durou pouco, porém, essa sua convicção. Sem explicar os motivos da sua mudança de rota, o presidente da Câmara passou a desenvolver um contorcionismo verbal para desdizer o que havia dito.
Os discursos posteriores foram outros
Já em 7 de abril, ao participar de evento na Associação Comercial de São Paulo, o discurso era outro. Disse que o projeto de anistia precisa ser tratado com sensibilidade e que não é uma prioridade. A partir daí, foi fazendo arrumações em seus pronunciamentos, tentando deixar para trás suas opiniões iniciais. Defendeu que é preciso ter responsabilidade para não aumentar a crise institucional presente no país.
É “um Motta”
Estão todos de olho nas palavras de Motta, porque cabe ao presidente da Câmara pautar o projeto. Diante dessa enxurrada de assinaturas, vai ser difícil resistir, pois pode correr o risco até de se fragilizar diante de seus pares.
Por outro lado, na eventualidade de estar sofrendo pressões, próprias da política, precisará avaliar o que será mais conveniente para o bem do país, para o bem da justiça, para sua convivência na Câmara e para seu próprio benefício.
Como dizia José Bonifácio de Andrada e Silva: “Sou brasileiro. Antes de ser brasileiro, sou paulista. Antes de ser paulista, sou santista. Antes de ser santista sou um Andrada.” Ao sopesar os prós e contras, a decisão do presidente da Câmara, naturalmente, considerará que ele é “um Motta”.
Um pedido de anistia
Estava pensando como o presidente Lula conquistaria o coração dos brasileiros se tomasse a iniciativa de enviar ao Congresso um pedido de anistia. Nada complicado. Com palavras simples e de forma clara, poderia dizer:
“Anistia é um ato unilateral de poder, mas pressupõe, para cumprir sua destinação política, haja, na divergência que não se desfaz, antes se reafirma pela liberdade, o desarmamento dos espíritos pela convicção da indispensabilidade da coexistência democrática. A anistia reabre o campo de ação política, enseja o reencontro, reúne e congrega para a construção do futuro.”
Anistia geral e irrestrita
O que você achou? Brando demais para esses golpistas que precisam ser duramente condenados, até como exemplo para que outros não se aventurem a repetir o que aconteceu naquele triste 8 de janeiro? Pois tenho uma surpresa para muitos.
Essa mensagem, que hipoteticamente teria sido de Lula, é, na verdade, do então presidente João Baptista Figueiredo, ao defender, em 27 de junho de 1979, o pedido de anistia, cuja lei seria assinada em 28 de agosto daquele mesmo ano.
Nesse dia, foram anistiados, de forma geral e irrestrita, não apenas os críticos ao regime, mas também quem havia pegado em armas para derrubar o governo. Todos aqueles que estavam exilados puderam voltar ao país. Os presos foram libertados e puderam deixar os presídios e delegacias. Essas anistias foram perfeitas? Certamente que não. Foram cometidas injustiças? Provavelmente que sim.
Uma pedra sobre o passado
O que vale são as palavras de Figueiredo: “Lugar de brasileiro é no Brasil.” E assim, maridos, esposas, filhos, pais, irmãos puderam se reencontrar. Deixaram apenas para a história as antigas divergências.
Ou não é isso que desejam os 264 deputados que assinaram o documento? Que se vire a página. Que se reabra o campo de ação política. Que, enfim, se coloque uma pedra sobre o passado, com todos de volta ao jogo, gostemos ou não dos jogadores. Siga pelo Instagram: @polito