Vamos falar sobre desarborização urbana e suas consequências?

Quando me mudei para o bairro onde moro, o que mais me chamava a atenção, era o volume de árvores plantadas nas ruas. Ser atingido por amoras, goiabas e abacates que caiam “de maduros”, era fato corriqueiro. E as jacas? Confesso que tinha certo receio de ser atingida por uma delas nos passeios realizados no final da tarde. De qualquer forma, a vizinhança e os pássaros conheciam a época “perigosa” de queda para cada uma das frutíferas da rua. O cuidado para evitar ser atingido por um deles, era redobrado naqueles períodos. Hoje, as mudanças provocadas pelo adensamento desenfreado resultante das diretrizes provenientes do Plano Diretor Estratégico de São Paulo, associado às regulamentações relacionadas à retirada de árvores nos eixos de desenvolvimento da transformação urbana, ao longo dos corredores de transporte público e dos seus arredores, vêm provocando uma redução do número de espécies plantadas em alguns da cidade.

Números extraídos dos relatórios apresentados pelo site da Coordenadoria de Governo Aberto (CGA), que é uma área da Secretaria Executiva de Relações Institucionais (SERI), ambas da Prefeitura de São Paulo sobre os serviços de poda, remoção, transplante e plantio nas subprefeituras entre os anos de 2017 até 2022, apresentam dados inquietantes: a maior remoção de árvores aconteceu nas subprefeituras Pinheiros, Penha, Butantã, Santo Amaro, Lapa, Cidade Ademar, Jaçanã, enquanto o maior plantio de árvores ocorreu em Vila Mariana, Santana, Guaianazes e Ermelino Matarazzo. No caso de São Miguel Paulista, não ocorreu nenhum plantio, apenas remoção. Para o advogado Flávio Scavasin, que atua como ativista urbano junto ao Coletivo das Vilas Beatriz, Ida e Jataí e é coordenador adjunto do CADES Pinheiros, a desarborização da cidade de São Paulo dificulta o cumprimento das metas propostas na Agenda 2030 previstas pela atual gestão. Em quatro anos, só a região da Subprefeitura de Pinheiros perdeu mais de três mil árvores, situação essa, para ele e para os leitores, inadmissível. Scavasin acrescenta que “isso resulta da verticalização desenfreada, voltada a tratar a demanda por unidades habitacionais em ativos financeiros e não em moradias permanentes. Para atender aos projetos arquitetônicos propostos pelas construtoras, utiliza-se a seguinte lógica perversa: ao invés de mudar o projeto de arquitetura, remove-se a árvore sob pretextos diversos. Alguns motivos para a remoção podem ser lícitos e outros, no mínimo, questionáveis. O bairro de Pinheiros está se tornando em uma estrutura cinza e cada vez mais sombreada pelos novos edifícios. Um horror!”

Na cidade de São Paulo, o plantio de árvores é realizado pelas subprefeituras em caráter compensatório, ou seja, a cada árvore removida no território da subprefeitura uma outra deve ser plantada em qualquer lugar da cidade. É neste momento que as questões relacionadas ao microclima, permeabilidade e diversidade biológica local são atropelados pela lógica do adensamento construtivo apenas. Caberá aos munícipes uma atenção maior à alteração das regulações urbanas e participação ativa (mobilização social intensa associada aos meios de comunicação e redes sociais) para incluir cotas de construção por quadras evitando, desta maneira, que blocos de edifícios multifuncionais dominem a paisagem dos bairros removendo árvores ou deixando-as doentes de tal forma que precisem de remoção. Árvores plantadas em frente às calçadas, demandam cuidados redobrados para a manutenção de sua saúde, situação que nem sempre é o foco das empresas de construção civil. Plantar de onde foi removida a árvore, é a solução lógica. Uma breve pesquisa no Projeto de Lei Orçamentária Anual – 2024 (portal Participe+) que propõe a participação dos cidadãos na elaboração do orçamento do próximo ano, aponta centenas de solicitações envolvendo questões relacionadas ao plantio de árvores, combate ao desmatamento, permeabilidade do solo por meio da vegetação na rua, ou seja, no local de moradia dos munícipes apontando o desejo de soluções locais e não, no âmbito geral, como o praticado pela municipalidade. Remover a árvore da minha rua e plantar em outro lugar, não tem sentido algum quando o assunto é microclima e bem-estar do morador.

Venho observando publicações nas redes sociais, uma série de fotos em que o prefeito Ricardo Nunes aparece sorridente, em diversos locais, vestindo um capacete na cabeça e uma enxada na mão em situação que, me parece, um slogan antigo, do tipo “Ricardo trabalhador” como se estivesse “mostrando serviço”. Recomendo ao prefeito que, inicialmente, apareça nas fotos utilizando todos os equipamentos de segurança previstos em lei. É didático para todos os profissionais envolvidos nos setores da construção civil – daquele que cumpre o papel de auxílio às obras aos engenheiros e arquitetos envolvidos. Desejo vê-lo saudável e bem, gozando de boa saúde. Evitar acidentes e servir de exemplo é prioridade. Num segundo momento, recomendo fortemente que conheça a atuação de duas, dentre diversas prefeitas, que praticam boas práticas de gestão pública com a participação e interação da população.

Em Barcelona, a prefeita Ada Colau busca o diálogo com os cidadãos e demais gestores, implantando o “urbanismo da vida cotidiana”, ou seja, um programa de governo que busca a participação popular como princípio, sobretudo em associações de bairro e de representantes de movimentos locais com o objetivo de orientar políticas e ações voltadas à mobilidade urbana, ecologia e habitação. Ela própria se declara ativista urbana e utiliza sua experiência como ferramenta de governo. Ao utilizar as redes sociais, seu discurso é reconhecido pelos cidadãos pois, diferentemente da atuação de experts em marketing político brasileiro, os cidadãos a reconhecem como uma gestora atuante. Outro exemplo: Anne Hidalgo foi prefeita de Paris e propôs a criação de uma cidade em que o cidadão pudesse realizar suas atividades cotidianas próximo de sua moradia em, no máximo, 15 minutos. O plano de governo previa uma cidade voltada para o bem-estar dos cidadãos com ênfase nas questões voltadas à sustentabilidade urbana. Seu plano de mobilidade ativa levou a cidade de Paris a reduzir a poluição, priorizando os espaços para pedestres e moldando uma cidade mais verde, segura e saudável para os cidadãos.

Liderando ativamente causas de impacto social com a atuação da população, as campanhas tendem a ser racionais e menos onerosas. Prefeito, ainda há tempo disponível até a próxima campanha para interagir e dizer ao cidadão paulistano qual é marca da sua gestão. Capacete e enxada, não apresentam proposta alguma. Trabalhar, todos nós trabalhamos. E muito. Recomendo que o senhor, como prefeito, releia com atenção o plano de ações apresentados na Agenda 2030 voltados à gestão pública das questões que envolvem a arborização urbana sejam implantados. Não queremos um serra elétrica e sim, o que foi prometido em documento oficiais.