A Copa de 1938 foi a primeira com participação destacada da seleção brasileira

No dia 5 de junho de 1938, os brasileiros estavam colados ao rádio para ouvir uma transmissão que começaria às 11 horas da manhã. Era a estreia da seleção brasileira na Copa, diante da Polônia, diretamente de Estrasburgo, na França. A programação das emissoras, publicada nos jornais, confirmava o horário do jogo.

Pela primeira vez, os brasileiros ouviram uma partida de Copa pelo rádio. Em 1930, no Uruguai, e em 1934, na Itália, não houve transmissão. A novidade parou o Brasil. Coube ao pernambucano Leonardo Gagliano Neto narrar os jogos. O “speaker”, da Rádio Clube do Brasil, emissora do Rio de Janeiro, gostava de contar a saga dele em campos franceses: “Eu era o único locutor brasileiro a irradiar o Campeonato Mundial de 1938. Considero a mais arrojada das transmissões diretas, mesmo diante da televisão. O som era espetacular, perfeito. Eu utilizei os equipamentos e as linhas radiofônicas pertencentes ao Exército francês.” Apesar do heroísmo, infelizmente não existem registros desses áudios. 

Em 1938, foi formada para a transmissão da Copa a “Cadeia de Emissoras Byington”. Integravam o grupo: Clube do Brasil e Cruzeiro do Sul, do Rio de Janeiro, Cosmos e Cruzeiro do Sul, de São Paulo, e Rádio Clube de Santos, do litoral paulista. Gagliano Neto viajou no navio Arlanza, o mesmo que levou o time brasileiro, e foram mais de 15 dias até chegar à França. O narrador esportivo fazia questão de lembrar o poderoso ataque da seleção nacional: “O futebol brasileiro é uma máquina de atacar há 50 anos. Em 1938, o nosso forte era o ataque.”

De fato, a equipe brasileira entrou de vez no mapa do futebol mundial graças ao desempenho que teve naquela Copa. Ao contrário de 1930 e 1934, quando as entidades esportivas de São Paulo e do Rio de Janeiro estavam rachadas e em conflito, em 1938 finalmente reinou a paz e foi possível levar à Europa os melhores jogadores. Leônidas da Silva, o “Diamante Negro”, terminou a competição como artilheiro. Em 2006, a Fifa tirou um gol do craque brasileiro, ao revisar súmulas das partidas. Durante décadas foram contabilizados oito gols, mas, na verdade, ele marcou sete. Abaixo, a campanha brasileira em 1938. A FIFA não dividiu as seleções em grupos e cada fase já era eliminatória:

  • Brasil 6 x 5 Polônia – Estrasburgo
  • Brasil 1 x 1 Tchecoslováquia – Bordeaux
  • Brasil 2 x 1 Tchecoslováquia – jogo desempate – Bordeaux
  • Brasil 1 x 2 Itália – semifinal – Marselha
  • Brasil 4 x 2 Suécia – decisão do terceiro lugar – Bordeaux

Para o Brasil, a Copa de 1938 é importante por três fatores: a transmissão pelo rádio, o primeiro bom resultado da seleção e a decisão do governo brasileiro de dar todo o apoio à equipe nacional. O Brasil vivia a ditadura do Estado Novo e o presidente Getúlio Vargas sabia que o esporte ajudaria a projetar a imagem do país no exterior. Foi criada  a “campanha do selo” para arrecadar recursos que garantiriam a viagem para o continente europeu. De acordo com o IBGE, o Brasil tinha cerca de 40 milhões de habitantes em 1938.

A Copa foi disputada de 4 a 19 de junho, e o mundo já vivia um clima tenso que culminaria na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Alzira Vargas (1914-1992), filha do presidente da República, foi uma espécie de “madrinha da seleção”. A participação na Copa de 1938 representou o começo da projeção da identidade nacional no futebol e o rádio contribuiu para o processo. O narrador Gagliano Neto recebeu telegramas do ministro das Relações Exteriores, Oswaldo Aranha, para que evitasse, por exemplo, comentários mais exaltados durante o jogo contra a Itália, pela semifinal. O governo de Getúlio Vargas tinha proximidade com o regime de Benito Mussolini. 

A seleção era treinada por Ademar Pimenta, que se destacou no comando do Madureira, do Rio de Janeiro. O grupo brasileiro fez uma preparação em Caxambu (MG) e partiu para a Europa no dia 30 de abril, a bordo do navio Arlanza. 

Um dos grandes duelos do mundial foi a vitória diante da Polônia pelo placar de 6 a 5. Já a derrota para a Itália, por 2 a 1, na semifinal, gerou protestos da comissão técnica por causa da marcação de um pênalti em favor da “squadra azzurra”. Os jornais da época deram destaque à possibilidade de a Fifa anular o jogo, o que não se confirmou. Os italianos conquistaram o bicampeonato mundial com vitória diante da Hungria: 4 a 2.

Ouça agora mais histórias da Copa de 1938 e o perfil de dois craques brasileiros: Leônidas da Silva e Domingos da Guia