Antropologia cognitiva

Existem duas emergências sociais visíveis para se criar teorias ou, no popular, parar para pensar sobre determinado assunto:

  • algo que incomoda/cria oportunidades para os humanos para melhorar de vida/sair de crises;
  • algo que se modifica ao longo do tempo com impacto na vida das pessoas, que precisa ser compreendido para ser administrado.

Tudo que é estático, não muda e não gera valor e/ou não incomoda fica sem estudo teórico (incluindo infelizmente o que incomoda quem está na periferia do sistema).

Não há especialistas sobre o Pão de Açúcar, montanha, pelo simples fato de não ser um vulcão que entra em erupção e por não ter ouro dentro dela. Como ela não se move e não atrapalha a vida de ninguém, é um objeto desinteressante para pesquisa.

Existem diversos campos que foram criados para compreender as mudanças sociais, entre eles, economia, ciência política, sociologia, antropologia, psicologia, comunicação, ciência da informação e ecologia, que procuram analisar como macro ou micro mudanças em seus campos afetam a sociedade.

A chegada da Internet criou um problema teórico para esses campos, pois:

  • os ambientes cognitivos que antes não se moviam de forma mais radical agora se mostraram instáveis e provocadores de fortes mudanças. Ou seja, fomos pegos de calça curta, pois ainda não há suficientes pesquisadores especializados em macro mudanças cognitivas, nem campo de estudo e nem tradição na área. É um bebê sem maternidade, pedindo leite e fralda e sem uma enfermeira para reduzir o choro;
  • é um estudo que exige uma visão de longo prazo e pede uma visão abstrata em um mundo muito condicionado a memorização. Além disso, nossas ciências, como as demais organizações da sociedade, perderam a capacidade de estudos de maior fôlego, pois estão vivendo a fase decadente de um forte controle das ideias e do umbiguismo organizacional, veja mais sobre isso aqui e aqui também.

Os campos da comunicação e da ciência da informação deveriam, por tradição do estudo do objeto, darem conta dessa mudança, porém os ciclos das mudanças nos ambientes cognitivos são muito longos, que demandam estudos de milênios, séculos e décadas, diante da abordagem dessas ciências muito curtas.

Um estudo dessa natureza exige um esforço extra e um tipo de cognição mais abstrata do que estamos acostumados.

Nossas ciências, todas elas, trabalham apenas com ciclos curtos de acontecimentos, mesmos as que lidam com macro acontecimentos, tais como economia e ecologia.

Os ciclos cognitivos (fala, escrita, escrita impressa, computador, Internet) e suas consequências demoram ou demoravam mais tempo para surtir efeitos.

A história da ciência da informação, por exemplo, é um campo de estudo, mas a história da informação é algo ainda muito novo e incipiente, como lementa Tony Weller.

As nossas teorias de plantão têm causas e consequência muito próximas e têm grande dificuldade de ver macro mudanças.

O campo da antropologia cognitiva, se podemos chamar assim, é inspirado em Pierre Lévy, que conseguiu, de forma muito fácil e de clara compreensão, estabelecer uma relação de mudanças do mundo oral, escrito e digital. Em uma só tacada, em um conjunto de livros, defendeu:

  • que estamos vivendo uma macro mudança histórica cognitiva;
  • que para compreendê-la temos que analisar grandes ciclos históricos, pois se iniciam muito tempo atrás e impactam no hoje;
  • e que compreender essas mudanças é algo fundamental para quem quer participar/interferir no processo de mudança do futuro.

Assim, é preciso uma teoria/campo de estudo que possa ser capaz de dar melhores respostas sobre o problema: quais os impactos/condicionamentos a internet traz para o mundo?

O que nos joga para questões filosóficas interessantes:

  • somos condicionados de que maneira pelas tecnologias?
  • e de que maneira pelas tecnologias cognitivas?
  • e de que maneira pelas tecnologias cognitivas reintermediadoras que descontrolam ideias?

Precisamos de teorias que possam casar o estudo da informação com comunicação e tecnologias (somando ainda com biologia, filosofia, história, com variantes sociais, políticas e econômicas) para que possamos entender o que está acontecendo, através de macro cenários e seus efeitos de curto, médio e longo prazo sobre a sociedade em vários campos.

Não estamos falando aqui de uma pesquisa, de um campo de pesquisa, ou um sub-campo de uma dada ciência, mas de uma nova linha de estudos, em torno de um problema central e relevante, como devem ser as Ciências com caixa alta, pela ordem, do mais palpável para o abstrato:

  • Quais os efeitos da Internet para a sociedade?
  • Quais os efeitos das tecnologias cognitivas para a sociedade?
  • Quais os efeitos das tecnologias cognitivas reintermediadoras para a sociedade?

Para que se possa administrar de alguma forma e com menos sofrimento social (papel dos cientistas) o caos que elas trazem embutido.

Existem mudanças em curso que claramente nenhuma teoria de plantão consegue justificar, tal como a primavera árabe, o Google, o Linux, a colaboração de massa. Ou seja, os movimentos políticos, sociais e econômicos que pipocam em todo o mundo e o papel das novas mídias como motivadoras.

Se não tivermos, portanto, uma forte ajuda de uma visão macro cognitiva antropológica para compará-los com a chegada da prensa em 1450, por exemplo, fica muito mais difícil compreendê-los. Tal visão de largo horizonte só pode ser abrigada em um novo campo de estudo, que permita trabalhar e relevar micro mudanças para conseguir enxergar um cenário mais amplo (com todos os defeitos e qualidades que tal ação implica).

É como se depois de vários séculos de estudo um novo campo começa a competir com outros que se arvoram no direito de definir as mudanças históricas, mas que não têm pernas para explicar as que são frutos das mudanças cognitivas.

Agora, podemos dizer com segurança que as macro mudanças nos ambientes cognitivos não podem ser descartadas para a compreensão do século XXI hiper conectado.

A ciência, aliás, tem esse papel, transformar o que parece magia em fórmulas!

A chegada da Internet ainda nos parece algo intergalático, pois ainda não tem uma teoria e um campo consistente de pesquisa que possa realmente entendê-la.

Está órfã.

Precisamos de fórmulas eficazes urgente, pois o tempo urge e o trem apita no horizonte.

Fonte: http://imasters.com.br/gerencia-de-ti/tendencias/antropologia-cognitiva/

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