Congresso do Equador inicia nesta terça processo de impeachment do presidente Guillermo Lasso  

O Congresso do Equador inicia às 10h (12h no horário de Brasília), desta terça-feira, 16, o processo de impeachment do presidente impopular Guillermo Lasso, acusado de corrupção na gestão da estatal Frota Petroleira Equatoriana (Flopec), por meio de contratos celebrados entre 2018 e 2020. O resultado, que pode demorar dias para sair, pode colocar fim ao governo de direita e dar vantagem para o principal bloco de esquerda recuperar forças com a liderança do ex-presidente Rafael Correa, foragido – ele vive na Bélgica desdr que deixou o poder – e condenado a oito anos de prisão. Esse processo de destituição, provoca os fantasmas da instabilidade política que o Equador viveu entre 1997 e 2005, quando três presidentes eleitos foram destituídos. Contudo, segundo o cientista político Esteban Nichols, da Universidade Andina Simón Bolívar de Quito, diferente do que se viu no passado, desta vez, o julgamento contra Lasso acontece “dentro dos canais institucionais” e não por meio de revoltas populares como aconteceu entre 1997 e 2005. Em caso de destituição, ele será o segundo presidente equatoriano a ser destituído do cargo – o primeiro foi Juan de Dios Martínez em 1933 – e será substituído pelo vice-presidente Alfredo Borrero, para completar o mandato de quatro anos. Os dois foram eleitos em chapa conjunta. O processo desta terça-feira pode resultar em três possíveis cenários: sua destituição, a dissolução do Congresso ou a sua permanência no cargo.

No domingo, 14, o Congresso, dominado pela esquerda, convocou 137 membros por meio do titular da unicameral Assembleia Nacional, Virgilio Saquicela. Do total, é necessário obter 92 votos para tirar Lasso do poder. Ele está no cargo desde 2021 e, de acordo com as denúncias, ele prosseguiu com um contrato assinado antes de sua posse para o transporte de petróleo bruto com o grupo internacional Amazonas Tanker, que provocou prejuízo superior a seis milhões de dólares. Essa não é a primeira vez que o líder equatoriano se vê pressionado. Em junho de 2022, o Parlamento tentou, por votação direta, destituí-lo durante os violentos protestos indígenas contra o alto custo de vida. Na ocasião faltaram 12 votos para concretizar a destituição em meio a uma grave crise política. Caso escape novamente, Lasso observará apenas que “o país seguindo ladeira abaixo” porque terá que governar com um Congresso de oposição e sem pontes de comunicação, fala o constitucionalista Rafael Oyarte.

Em março, o Equador voltou a mergulhar em uma crise política quando a oposição propôs o impeachment do chefe de Estado, que foi aprovado pela Corte Constitucional. A Constituição também permite que o governante dissolva o Congresso, uma vez e nos três primeiros anos de mandato, e convoque eleições gerais antecipadas para completar o período constitucional de quatro anos, opção que Lasso tem antes de ser removido do cargo. O ministro do Governo, Henry Cucalón, disse na quarta-feira. 10, que Lasso se apresentará ao Congresso quando for convocado. Com todos os aliados, o governo tem apenas 25 legisladores contra 49 do ‘correísmo’. E Lasso não enfrentará apenas esta corrente, mas também o esquerdista Pachakutik, braço político do influente setor indígena e segunda força no Congresso, com 20 cadeiras. Na segunda-feira, 15, a Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) pediu que o julgamento político do direitista Guillermo Lasso ofereça “garantias” e respeite o devido processo. Em comunicado, eles insistiram na necessidade de que o julgamento “ofereça todas as garantias da Justiça e respeite as regras do devido processo”. “O princípio deve ser o respeito aos mandatos constitucionais de presidentes eleitos pelo voto popular, que os termos e prazos presidenciais sejam exercidos sem pressões ou ameaças”. A Secretaria-Geral da OEA considera “fundamental que todos os atores que participarem deste processo atuem com a maior responsabilidade e moderação política e institucional”, ressaltou em seu comunicado, compartilhado por Lasso.

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Manifestantes participam de um protesto para exigir o impeachment do presidente do Equador, Guillermo Lasso, do lado de fora da Assembleia Nacional em Quito│RODRIGO BUENDIA / AFP

Três possíveis cenários

O presidente do Equador, Guillermo Lasso, um ex-banqueiro de direita de 67 anos, tem três possibilidades diante de si no julgamento político que enfrenta: ser destituído, dissolver o Congresso ou permanecer no cargo com um Legislativo dominado pela esquerda. Nos primeiros dois anos dos quatro para os quais foi eleito, o chefe de Estado não conseguiu um acordo com a esquerda majoritária no Legislativo, ocasionando uma instabilidade política que lembra a registrada entre 1997 e 2005, quando três presidentes caíram.

Destituição

A Assembleia deve reunir o voto de dois terços de seus membros (92) para destituir o presidente, que, por lei, é possível em caso de crimes contra a segurança do Estado, corrupção e genocídio ou desaparecimento de pessoas. Lasso é acusado pelo grupo político de Correa de suposto peculato na gestão da empresa de transporte marítimo estatal Frota Petroleira Equatoriana (Flopec). Segundo as acusações, o presidente não ordenou o encerramento de um acordo – assinado antes de sua posse – para o transporte de petróleo com o grupo internacional Amazonas Tanker, apesar de o mesmo ter causado prejuízos de mais de 6 milhões de dólares (cerca de R$ 29,5 milhões, na cotação atual).

O líder equatoriano, que afirma ser inocente, deverá comparecer ao plenário do Congresso nesta terça para dar sua versão e ouvir a contraparte. Se não o fizer, será julgado à revelia. Depois, acompanhará um processo de votação que pode levar vários dias. Caso seja destituído, ele será substituído pelo vice-presidente Alfredo Borrero, com quem foi eleito na mesma chapa. O novo presidente, que deverá concluir o atual mandato de quatro anos, apresentará uma lista ao Congresso para a designação do vice-presidente.

Dissolução do Congresso

Lasso tem a opção constitucional de dissolver o Congresso, uma única vez e nos três primeiros anos de governo, para dar lugar a eleições gerais antecipadas, de onde sairia um governante encarregado de concluir o atual mandato. Essa opção, chamada de “morte cruzada”, pode ser decretada antes da votação do impeachment. O presidente indicou que recorreria ao caso de obstrução da execução do Plano Nacional de Desenvolvimento, que não exige decisão prévia do Tribunal Constitucional, para dissolver o Congresso.

A lei também permite que o presidente dissolva o Congresso por grave crise política e comoção interna, e por desvio de função. “Esse é o melhor cenário para o ‘correísmo’ [grupo político de Rafael Correa] porque, nos próximos 45 dias, teríamos eleições”, opina Oyarte. Essa corrente política quer voltar ao poder, apesar de seu líder ter uma condenação no Equador a oito anos de prisão por corrupção. “A chamada ‘morte cruzada’ seria claramente uma irresponsabilidade política do presidente. Ou seja, para evitar sua destituição, ele permanece no cargo por mais três ou cinco meses, dependendo ou não da existência de um segundo turno presidencial, e entrega a faixa presidencial para alguém de esquerda”, acrescentou Oyarte.

Permanecer no cargo

Para evitar a destituição, Lasso precisa de 46 votos no Congresso. Em junho de 2022, o Legislativo reuniu 80 das 92 cadeiras em uma votação direta com a intenção de removê-lo por causa da grave crise política ocorrida durante os fortes protestos de indígenas pelo alto custo de vida, que deixaram muitos mortos e centenas de feridos. No domingo, o Congresso teve eleições internas para seu principal órgão administrativo e a oposição – majoritária, mas também dispersa – conseguiu os sete cargos dessa entidade com até 100 votos. Se permanecer no cargo, o presidente, cujo partido conta com uma dúzia de cadeiras e soma um total de 25 com seus aliados, continuará enfrentando instabilidade institucional.”O que o presidente Lasso vai fazer nos dois próximos anos? Pois ele terá que trabalhar com esta Assembleia, com uma situação de um presidente que rompeu todas as pontes e canais de comunicação com os demais partidos”, questiona Oyarte

*Com informações da AFP