Dá para ser otimista mesmo diante de situações adversas

Ao nos distanciarmos de determinado problema, podemos obter uma nova perspectiva do fato. Até nos surpreendemos, às vezes, ao constatar depois que o cenário que aparentava ser o desvio de uma situação confortável talvez nem fosse negativo ou disruptivo. Nada como um bom exemplo para nos ajudar a entender esses fenômenos. Certa vez, recebi mensagem de um querido amigo, o palestrante Eugenio Mussak. Ele estava chateado. Algo saíra errado na sua mudança de um apartamento para o outro. Por isso, teve de se acomodar provisoriamente em um lugar sem muita condição de habitabilidade. Ao falar comigo, estava inconformado: “Polito, estou aborrecido. Não encontro nada. As nossas roupas amontoadas, os meus livros encaixotados, os meus objetos pessoais do dia a dia brincando de esconde-esconde. Não vejo a hora de terminar a arrumação do novo apartamento e sair daqui”.

Realmente, devia ser mesmo uma situação desconfortável. Com tudo fora do lugar, dá para imaginar, um escritor e educador como ele precisando dos livros para fazer pesquisas e não saber por onde começar a procura. Como pode acontecer entre amigos, eu disse a ele: “Eugenio, acho até que essa é uma fase difícil, mas que pode ser vista como um desafio. Você está vivendo um instante diferente, inédito e instigante na sua vida. Que tal encarar esse perrengue numa boa e tentar tirar daí alguns ensinamentos?”. Naquela mesma semana, ele contou toda essa história em uma das revistas da Editora Abril, para a qual escrevia regularmente. Falou da realidade que estava vivendo e de como mudara sua percepção do fato a partir da conversa que mantivemos. Um texto primoroso, repleto de ensinamentos para quem tivesse de enfrentar situações semelhantes. Li com surpresa o artigo. Pela forma como dizia ter se divertido com os contratempos e contornado os obstáculos, concluí que eu havia apenas tentado tranquilizá-lo, mas após ler seu texto senti que estava aprendendo com as minhas próprias lições. Só um fato me chamou a atenção. Fui citado na matéria pelo meu primeiro nome. Ninguém me chama de Reinaldo. Nem mesmo os amigos mais próximos. Todos se acostumaram a me tratar por Polito. Tudo certo. Talvez imaginasse que assim estaria se referindo a mim de forma mais carinhosa.

Não deu outra. No dia seguinte, ele me ligou pedindo desculpas. Eu contestei: “Desculpas por quê? O que valeu mesmo foi ver nossa conversa narrada com tanta competência”. Ele insistiu: “Polito, eu escrevi seu nome completo, mas o editor disse que não seria possível porque dessa forma faria propaganda da sua atividade”. Achei curioso e comentei: “Você não imagina como esse seu relato me deixa feliz. O que mais posso desejar na vida? Se a revista acha que o meu nome seria uma publicidade, significa que se transformou em uma marca conhecida da minha atividade. Vou emoldurar essa sua informação”. Depois de pensar um pouco, Eugenio comentou que essa situação havia passado despercebida por ele, mas que eu tinha toda a razão. E mais, que faria um texto contando essa nova conversa. Não soube se ele fez ou não o artigo. Sei, todavia, que mais um ensinamento fora aprendido. Nem todos os acontecimentos que à primeira vista parecem ser negativos, efetivamente o são. Em muitas circunstâncias acabam por se transformar em oportunidade extremamente promissora.  Segundo o linguista da Universidade de Provence, Daniel Faïta: “A atribuição de “sentido” a um objeto (a uma palavra) não é uma operação de etiquetagem, mas, sim, o produto de uma relação que cada indivíduo, cada locutor ou interlocutor constrói a seu modo”.

E complementa explicando que “se trata de uma operação que implica uma grande parte de subjetividade, o ponto de um processo e não de um procedimento totalmente estabelecido”. Quantas experiências negativas num primeiro momento se mostram valiosas no final das contas. Ou seja, de maneira bem simplificada, tudo tem a ver como o nosso cérebro funciona. As nossas atitudes, opiniões, ações habituais passam por um estado de transformação permanente. O aqui e agora exige de nós a busca constante de informações que, por sua vez deverão ser selecionadas, arquivadas e abandonadas ou esquecidas. Um exercício trabalhoso e muitas vezes estressante. Por isso, antes de nos desesperarmos com os percalços, vale a pena analisar nossa disposição de estarmos abertos a novos ensinamentos, e ressignificar não só o que acontece a nossa volta, mas, da mesma forma, nosso jeito de pensar e de ser. Sem dúvida, há males que vêm pra bem. Siga pelo Instagram: @polito