Em meio a disputa entre governo e oposição por controle de CPMI, Lira será fiel da balança para definir rumos da comissão

Às vésperas da leitura do requerimento para instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, lideranças do governo Lula 3 e da oposição ao Planalto travam uma batalha pelo controle do colegiado, que será formado por 16 deputados e 16 senadores. O embate entre a base e o bloco oposicionista era previsível, visto que os rumos das investigações podem desgastar as imagens dos dois expoentes destes grupos, o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, e seu antecessor, Jair Bolsonaro. A queda de braço, no entanto, coloca o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e seu superbloco partidário, o maior da Casa, formado por mais de 170 deputados, como o fiel da balança para a composição e os rumos dos trabalhos da CPMI.

No Senado, o Palácio do Planalto enxerga um cenário mais favorável – líderes da base estimam, inclusive, que terão 11 dos 16 senadores, já que os dois principais blocos da Casa são compostos pelo PT, partido de Lula, e pelo MDB, capitaneado pelo senador Renan Calheiros (AL), cotado para relatar a comissão. Entre os aliados do presidente da República, há a expectativa de que senadores que integraram a CPI da Covid-19, instalada durante a gestão Bolsonaro, integrem o colegiado. Os nomes de Omar Aziz (PSD-AM) e Otto Alencar (PSD-BA), são aventados. O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), é cotado como suplente. O bloco da oposição deve ser representado pelos senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Jorge Seif (PL-SC), Magno Malta (PL-ES) e Eduardo Girão (Novo-CE).

Na Câmara, porém, o ambiente é mais adverso. Parlamentares ouvidos pelo site da Jovem Pan afirmam que a postura de Arthur Lira e de seu entorno será fundamental para ditar os rumos da CPMI. O “superbloco”, formado por PP, União Brasil, PSB, PDT, Solidariedade, Avante e pela federação Cidadania-PSDB, deve indicar cinco deputados. O União Brasil, por exemplo, foi contemplado com três ministérios, mas se diz independente e abriga parlamentares como o deputado federal Deltan Dallagnol (PR). O Progressistas, por outro lado, possui uma bancada heterogênea, composta por aliados de Lira e políticos ligados ao senador Ciro Nogueira (PP-PI), que foi ministro da Casa Civil de Bolsonaro. O Avante, em contrapartida, é o partido de André Janones (MG), que se notabilizou por confrontos com bolsonaristas nas redes sociais.

O segundo maior bloco da Câmara, formado por Republicanos, Podemos, MDB, PSD e PSC, deve ficar com quatro cadeiras. O grupo possui siglas da base de Lula, como MDB e PSD, que também possui cargos no primeiro escalão do governo Lula, e partidos independentes, como o Republicanos, legenda do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. A federação entre PT, PCdoB e PV e a bancada do PL também terão mais de uma indicação. Segundo cálculos de parlamentares da base, o governo pode ter até 10 das 16 cadeiras reservadas aos deputados. Porém, isso vai depender de acenos diretos de Lula a Lira. Aliados do presidente da Câmara afirmaram ao site da Jovem Pan que o cacique do Centrão terá papel “fundamental para garantir a maioria governista” na CPMI, sendo considerado o principal nome para estabelecer os rumos do colegiado. No entanto, o entendimento é que os acenos do Planalto “não estão muito claros” e caberá o chefe do Executivo um “olhar mais atento” ao Congresso Nacional.

“O Governo não ganhou com maioria na Câmara, então precisa dialogar, conversar com os líderes, com o Arthur Lira e os blocos. Se não conversar, não terá maioria na CPMI. O Governo tem que ir para o embate, então Lula precisa conversar com Lira. Ele é o maior articulador hoje na Câmara dos Deputados”, afirmou o deputado federal José Nelto (PP-GO) à reportagem nesta segunda-feira, 24. Segundo o deputado, é possível que os indicados pelo superbloco do Progressistas sejam favoráveis ao governo, mas o cenário dependerá da ” habilidade política do governo” e de suas lideranças. “Michel Temer não formou maioria para aprovar as reformas? O Jair Bolsonaro não arrumou maioria para não ser impeachmado? Então, com o Lula não é diferente. O governo não está reagindo e Lula não pode ficar pensando que vai governar com governadores. Não vai. Para governar, o governo precisa do do Congresso”, concluiu.

Diante da movimentação governista, parlamentares da oposição a Lula cogitam contra-atacar para obstruir os trabalhos da comissão. Uma das possibilidades aventadas nos bastidores é não indicar os parlamentares para a CPMI. A estratégia seria uma espécie de resposta à mudança de postura do governo, que inicialmente era contra a comissão e, após a divulgação das imagens de câmeras de segurança do Planalto, passou a defender o início dos trabalhos. Considerando o cenário em que os parlamentares serão todos indicados, haverá uma nova disputa, envolvendo as escolhas para a presidência e a relatoria do colegiado. Se não houver acordo, os postos serão definidos por votação. Partidos aliados a Lula querem evitar, por exemplo, que o deputado federal André Fernandes (PL-CE), que coletou as assinaturas para a criação da CPMI, fique com a presidência. “A presidência será do bloco governista; o relator também. Nunca aceitaríamos que esse deputado, que está sendo investigado no STF por esse ato, seja presidente da comissão”, disse o deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ), que pleiteia uma vaga na comissão parlamentar.

Neste quesito, inclusive, há uma disputa velada entre Renan Calheiros, cotado para o posto de relator, e Arthur Lira. Para evitar que seu principal adversário político no Estado de Alagoas tenha protagonismo na comissão, o deputado do PP se movimenta, segundo relatos feitos à Jovem Pan, para emplacar André Fufuca (MA), aliado de primeira hora do presidente da Câmara, para o cargo. Fufuca é descrito por colegas como “preparado e um conhecedor do Parlamento”. Como a Jovem Pan mostrou, embora a maioria governista seja algo esperado, o Planalto deve se preparar para enfrentar uma “minoria barulhenta”, o que torna ainda mais indispensável assegurar um cenário mais confortável ao governo.