Exclusiva: ‘Tive que me reinventar e me tornei terapeuta transpessoal para curar traumas, inclusive de um abuso’, diz Analice Nicolau

“Não é sobre se vitimizar, e sim sobre encarar de frente e não deixar que mais ninguém coloque limites em sua vida”, diz Analice Nicolau. A jornalista, que atualmente é colunista do Jornal de Brasília e também CEO da AN Connect, agência 360 que traz soluções em comunicação para diversas empresas e profissionais. Da catarinense que era atleta de handebol à âncora de telejornal foram anos de bancada, programas e muitos desafios, sendo que hoje ela declara que “pode livremente sorrir de novo”. Dedicada, ela modelou até o início dos anos 2000, quando foi convidada para posar nua e ser musa da revista Sexy

Logo depois do sucesso da publicação, em 2002, ela foi convidada pelo próprio Silvio Santos para participar do reality “Casa dos Artistas”. Meses após a saída do programa, durante um evento, Analice sofreu o trauma de um abuso. “Não sei se algum dia superamos. Acho que consegui ressignificar muitas coisas com a terapia. O trauma estava tão guardado na mente que jamais achei que teria esse acesso. Graças a Deus eu já tinha ferramentas para, aos 43 anos, enxergar de outra forma. O estupro não foi nada comparado ao que a gente vai descobrindo com o tempo, quando os véus caem e nos abrimos para ver que somos todos perfeitos e que Deus tem uma linda história para cada um. É sobre isso, não é sobre vitimização, é encarar de frente e não deixar mais ninguém colocar limites. Nós mulheres somos muito mais fortes do que imaginamos. Só que colocaram tantas crenças em nossas mentes que nos limitamos. E precisamos de homens fortes que também se respeitem e nos respeitem”, desabafa.

A experiência traumática e vários outros tombos durante a vida a levaram em busca do autoconhecimento através de cursos, mentorias e vivências, tanto que Analice hoje também atua como terapeuta transpessoal. “Com todo o conhecimento que adquiri e minhas próprias marcas, pude perceber como é importante que a gente tenha coragem de ir a fundo e encarar o que passamos, não como forma de aparecer ou ganhar mídia, e sim como experiência, porque traumas não devem ser guardados, mas verbalizados, discutidos e ressignificados. Sofri muito e ainda sofro até hoje. Não é fácil para ninguém nem foi para mim, mas o fato de ter ressignificado minha experiência faz com que minha mente atue de outra forma. Confesso que dói na alma, mas são feridas que precisam ser cicatrizadas todos os dias, e assim descobri meu propósito: ajudar e empoderar pessoas, principalmente mulheres”, afirma.

Em uma tarde de sexta-feira, ao tomar um café juntas e ouvir isso de uma colega jornalista que admiro, confesso que fiquei por alguns minutos um pouco sem chão e até sem graça ao fazer as perguntas que tinha que fazer. Achei que a saia justa da exclusiva seria sobre a saída do telejornalismo após mais de 16 anos de bancada, sem contar nos outros programas de entretenimento, e não foi. Me atrevo a escrever que o furo foi ainda maior duplamente: em primeiro lugar por levar essa mensagem linda pós-dor e de superação a tantos leitores desta nobre coluna e em segundo, pela confiança em mim depositada, afinal, sou fã de seu trabalho há muito tempo. 

A cada desdobramento, Analice com sabedoria ensina, é daquelas entrevistas que a gente aprende para valer e se emociona, tudo junto e misturado. Sobre atuar hoje atrás das câmeras, ela é precisa: “Quando fui dispensada do SBT, jamais tinha imaginado sair da bancada do jornalismo. Mas uma coisa era muito bem resolvida dentro de mim: eu queria alçar voos mais altos e o autoconhecimento me trouxe isso, aquilo ficou pequeno demais para mim. Sei que tenho muito mais a entregar do que tinha lá. Eu sou muito feliz e fico mais feliz ainda quando meus clientes estão frente às câmeras realizando os sonhos deles. Quero que eles sejam um sucesso. Não quero envelhecer no vídeo”.

Na opinião da jornalista, estamos vivendo uma ditadura velada há muitos anos. “Sei que isso tem muito a ver com toda a educação que tivemos, o mundo é assim. Com a internet, todo mundo virou jornalista e isso acaba fazendo com que nossa profissão não seja levada muito a sério. Mas não podemos desistir. A Jovem Pan mantém, há décadas, o padrão jornalístico ideal, da busca pela correta informação, com apuração e checagem dos fatos, de forma primorosa. Não é à toa que esta jornada já dura quase 80 anos e, hoje, além da rádio, está na TV, fazendo muito sucesso e liderando o ibope em muitos horários e com muitos programas. Sem dúvida, e mais do que nunca, a Jovem Pan é uma das principais referências no Jornalismo brasileiro. Sou fã desde pequena do ‘repita’”, brinca.

Inquieta, Analice revela que resolveu tocar em um assunto tão delicado anos depois do ocorrido como um alerta para outras mulheres, porque todas nós (e todos, na verdade) precisamos buscar conhecimento de forma constante. “Até hoje cuido da minha saúde mental e sempre trouxe essa questão em minhas entrevistas. Neste mês faz 10 anos que tive síndrome do pânico, ou como alguns chamam de estresse pós-trauma. Para mim, todo dia é um novo dia. Muitas vezes temos receio de nos abrir e falar sobre traumas. Explicar sobre a transição de carreira e até mesmo as transições de nossas idades é o que mais tenho feito. Não é fácil para ninguém e principalmente para nós mulheres, que muitas vezes achamos que precisamos, como diz o bom ditado, agir como os homens. Após anos estudando sobre isso, e também sobre as funcionalidades da mente humana, como profissional, consigo ajudar muitas mulheres e até homens a quebrarem essas barreiras. Me sinto realizada. Eu precisava de algo novo para me sentir viva e modificar, significativamente, tudo o que eu vinha passando. E hoje, consegui”, finaliza.