Honestidade e flexibilidade são segredos para liderança ambidestra

Por muito tempo, acreditou-se que para inovar é preciso rebeldia, mas inovar é confiança. “As pessoas precisam se sentir seguras e não ter medo do ridículo.” Foi com essa provocação que Rafa Brites, escritora e apresentadora, abriu o segundo dia do IT Forum Trancoso, que acontece de 19 a 23 de abril. A apresentadora conduziu um painel sobre ambidestria, tema central do evento, e avaliou que, mais do que ser ambidestro, é preciso ser polidestro, o que inclui lidar com diversas perspectivas da vida, seja ela profissional, ou pessoal, ao mesmo tempo.

Na visão de Jeane Tsutsui, CEO do Grupo Fleury, ambidestria é flexibilidade e ter a capacidade de lidar com incertezas. “Vivemos em um ambiente instável. Organizações têm de ter capacidade de entregar o dia a dia, manter a produtividade e entregar resultados de curto prazo, sem deixar de olhar o futuro. Organizações que conseguem ser ambidestras, navegam em ambientes de incertezas”, resumiu ela.

A executiva completou dizendo que times que inovam conseguem se adaptar em tempos de incerteza. A própria Jeane teve de colocar em prática essa máxima durante a pandemia, visto que naquele momento ela assumiu o posto máximo do Grupo Fleury, uma organização quase centenária, lidando com o fato de ter de ser ágil e inovadora em meio ao caos da Covid.

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No Google há 12 anos, Fabio Coelho, presidente da empresa no Brasil, afirmou que já viu a gigante de tecnologia se transformar muitas vezes. Três momentos, no entanto, foram muito emblemáticos. O primeiro deles foi com a chegada do desktop, depois a era mobile, quando previam o fim da empresa, porque a crença era a de que ninguém conseguiria fazer nada em telas tão pequenas. Foi, então, que os telefones cresceram e a tecnologia melhorou.

“Há alguns anos, começamos a falar de inteligência artificial”, listou, citando que as ondas tecnológicas impactam naturalmente companhias e usuários. “Para não deixar de ser relevante, é preciso ter confiança, com o conceito não mais de ‘e’, mas de ‘ou’”, completou. Por isso, segundo ele, o novo tem de ser incorporado e entendido, e, para ele, ambidestria é exatamente isso.

Papel do líder

E o papel do líder na ambidestria? Na visão de Diego Puerta, general manager da Dell Brasil, clareza e alinhamento de expectativas são chave na era da ambidestria e esse é um papel que o líder tem de fomentar. Para ele, a missão da empresa precisa estar clara, comunicada e entendida. “O exercício de comunicação é fundamental. Como conseguimos engajar? Com muita clareza”, respondeu.

Nesse sentido, Puerta também destacou o trabalho conduzido por Michael Dell, fundador da Dell. O executivo, à frente dos negócios até hoje, é um empreendedor em série, focado em inovação, mas ao mesmo tempo pragmático: inovar e executar estão em seu DNA.

Ricardo Guerra, CIO do Itaú, concordou com a visão dos demais executivos e propôs uma reflexão sobre um olhar muito voltado ao cliente. A inovação, afinal, precisa atender essencialmente ao cliente. “Percebemos que essa veia é fundamental para inovar, é crucial para nossa ambidestria. Se a gente olhar de perto, a maioria está vendo resultados, e tudo bem, mas precisa ter o mesmo peso de foco no cliente”, enfatizou.

Ele lembrou que o Itaú é uma empresa bastante consolidada, com mais de 65 milhões de clientes e essa óptica é chave para o negócio. Guerra exemplificou dizendo que em 1950 ninguém ligaria no banco e pediria um celular para fazer suas transações.

“Cabe a nós entender como inovar e trazer metodologia. As empresas estão atuando em silos e suas razões de viver são suas áreas. Veja o cliente, veja o acionista e transforme seu modelo de gestão, tudo ligado por um ponto de cultura e gestão”, provocou, reforçando que o segredo da ambidestria é ser honesto com a complexidade das coisas que precisam ser entregues e que a ambidestria tem dois lados. “Enquanto as empresas trabalharem esse dois lados juntos, não vai funcionar.”

Na ambidestria, saúde mental também importa

Outro tema que veio à tona na discussão foi a questão da saúde mental diante de tanta pressão por inovar, criar, e ser produtivo. Esse caldeirão gera sentimentos controversos. Jeane, do Fleury, relatou que a depressão já vem crescendo há tempos, acompanhada da ansiedade. Um impulsionador veio com a pandemia. Os líderes, então, precisam manter o equilíbrio diante desse cenário, saber reconhecer fraquezas e conviver com esse ambiente, com tranquilidade e confiança.

Puerta, da Dell, concordou e ressaltou que a vulnerabilidade é importante para quem está no front, já que liderar pelo exemplo é um clássico. “Todo mundo sabe que eu gosto de esporte, estar com a família e isso faz parte do meu equilíbrio. Se eu não estou bem como um todo é muito difícil estar bem profissionalmente”, afirmou.

O executivo lembrou de um momento crítico em sua vida. Ele assumiu a Dell no início da pandemia. Ao mesmo tempo, a mãe teve um AVC, ele perdeu seu pai para a Covid e sua esposa, grávida na época, também estava com Covid. “Foi desafiador, talvez o momento mais difícil da minha vida, mas nunca me senti tão acolhido. Eu queria me provar por ter acabado de assumir a liderança da Dell, mas eu percebi que essa era uma cobrança minha.”

Coelho, do Google, lembrou que a pandemia levou as pessoas a serem mais autênticas, sensíveis e vulneráveis e que elas passaram a entender a finitude do trabalho. “Eu gosto de work life blend. O modelo de revolução industrial está ultrapassado. Eu, por exemplo, trabalho mais do que 8h por dia. Quem acredita que empresa é meio? Cabe à liderança ter transparência em relação aos objetivos, construir relação de confiança, para que elas entendam que é mais do que trabalho”, pontuou.

Liderança influenciadora e honesta e exemplo impecáveis devem ser as marcas dos grandes executivos hoje, na visão de Guerra, do Itaú. E, para ele, exemplo impecável não é não errar, mas ser você mesmo, ser humano. “Em tempos de burnout, de entrega de resultados, o líder tem obrigação de criar isso. O papel da liderança é essencial a construção dessa nova cultura de trabalho.”

E a diversidade?

Para Jeane, do Grupo Fleury, a diversidade é chave no ambiente de ambidestria. Afinal, empresas que têm ambientes mais diversos, têm melhores desempenhos, aumentando performance e competitividade. “Estou em uma empresa que tem 80% de mulheres. Estou bem representada, mas sei que é difícil conviver com ambiente na maior parte de homens. Por isso, precisamos incentivar mulheres a assumir o papel, as mulheres precisam equilibrar tudo isso”, finalizou.

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