Incra dispensa pré-cadastro oficial para assentamentos; MST retoma papel de intermediador

Com a CPI do MST em curso, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) alterou as regras para a criação de novos assentamentos em terras públicas, dispensando o pré-cadastro na plataforma de governança territorial. O registro era uma exigência do TCU para comprovar a demanda de indivíduos e famílias por terras. Publicada no final do mês de julho e aprovada pelo conselho diretor do órgão, a instrução normativa permite que o cadastro de agricultores interessados em participar do Programa Nacional da Reforma Agrária (PNRA) seja feito, não só pelo Incra, mas por “outras instituições”; leia-se MST e congêneres.

O uso da plataforma de governança territorial era uma exigência do Tribunal de Contas da União, que, no último dia 30 de julho, notificou o Incra sobre os “novos processos de seleção de famílias”, “a recente paralisação no desenvolvimento e homologação dos módulos relacionados com a seleção de beneficiários da reforma agrária” e a suspensão ou perda de ritmo de “projetos relacionados com a transformação digital” do órgão. A área técnica do TCU recomendou diligências para a obtenção de informações sobre “os novos processos de seleção de famílias em andamento e também daqueles previstos, mas ainda não formalizados”.

Ex-presidente do Incra, Geraldo Melo Filho ressalta que o modelo de pré-cadastro visava evitar o direcionamento político da reforma agrária. “Nas gestões petistas ocorreram inúmeros casos envolvendo a formação de listas de beneficiários feitas por movimentos sociais, aliados políticos dos governantes.” Na prática, a política pública de criação de assentamentos passou a ser dirigida e direcionada para a militância. “Como resposta a isso, o TCU recomendou ao Incra que o procedimento de seleção precisaria ser modificado, abstendo-se de utilizar listas fechadas de beneficiários indicados por atores alheios aos quadros da autarquia, como movimentos sociais, associações, sindicatos, etc., de modo a cumprir o art. 37, caput, da CF/88”, explica Melo Filho.

Segundo ele, essa foi a maneira de dar acesso à reforma agrária para “qualquer cidadão que tenha interesse em produzir na terra, retirando a necessidade de que ele tivesse que viver em acampamentos, participar de invasões ou de precisar de qualquer intermediário para exercer seu direito”. Além de desrespeitar recomendação do TCU, a nova regra fortalece o papel dos movimentos como intermediários da reforma agrária, reduzindo a transparência do processo e impulsionando a cooptação de agricultores, ao restabelecer a formação de acampamentos como forma de definição de áreas para reforma agrária. O resultado já é conhecido: mais violência no campo.

O governo, por sua vez, alega que a medida facilitará “o mapeamento das áreas pelo Incra que podem ser destinadas à reforma agrária e dará condições ao poder público de formar um banco de terras para serem disponibilizadas aos beneficiários em cada região do país”. “Antes da instrução normativa, a parte técnica do instituto precisava praticamente detalhar o futuro assentamento em uma fase muito preliminar da ação de declaração de interesse social. Isso comprometia o andamento dos processos de implantação de áreas de reforma agrária como um todo”, justifica o Incra.