Lira dobrou a aposta; Lula vai arriscar?

Não adiantou Alexandre Padilha colocar panos quentes ontem na crise aberta com o Legislativo e negar qualquer problema com Arthur Lira. Poucos minutos depois, foi desmentido em rede nacional pelo presidente da Câmara, que, em tom professoral, disse que a “boa política” é feita com o cumprimento dos acordos firmados, em clara referência às seguidas traições com vetos de Lula a matérias aprovadas pelo Congresso depois de negociadas com a base do governo e com seu  ministro de Relações Institucionais. Isso ocorreu com o Marco das Garantias, a MP da reoneração da folha, o arcabouço fiscal, as emendas de comissão, o cronograma de pagamento das emendas impositivas, entre outros. Lira aproveitou para dizer que o orçamento “é de todos, não só do Executivo”. Fernando Haddad achou que poderia reparar o dano com uma reunião hoje, mas o parlamentar deu bolo no ministro da Fazenda e ainda mandou recado pelo líder do governo José Guimarães.

Analistas tentam extrair da postura de Lira uma estratégia relacionada à campanha antecipada para fazer seu sucessor em fevereiro de 2025 no comando da Câmara. Naturalmente, o presidente da Câmara sabe que precisa elevar o tom com o Executivo, em nome das lideranças partidárias, após o veto aos R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão. Só assim se negocia e ele estaria disposto a abrir mão do cronograma de empenho das emendas em troca da recomposição dos recursos. Mas Lira não está muito otimista, considerando os ataques de Gleisi Hoffmann às emendas e o discurso de Haddad, que tenta dividir com o Congresso a responsabilidade pelo déficit zero.

O poder de Lira para fazer seu sucessor está diretamente relacionado à capacidade de obter ganhos financeiros e políticos para os parlamentares junto ao Palácio do Planalto, mas esses ganhos estão cada vez mais restritos por causa da própria restrição do orçamento e das pautas de interesse do governo relacionadas à arrecadação — a maior parte já aprovada em 2023. Resta agora apostar no enfraquecimento político de Lula, reduzindo sua capacidade de fazer um candidato próprio capaz de bater o nome escolhido por Lira. O PSB já percebeu a estratégia e desembarcou do blocão que integrava ao lado de Progressistas e União Brasil, entre outros que apoiam o deputado.

Lula deu aval à saída do partido de Geraldo Alckmin, a quem cobra fidelidade, e também manteve o apoio a Padilha. Vamos ver qual será a próxima carta na mesa.