Lula diz que presidente do Banco Central ‘tem compromisso com o outro governo’

Após a coroação do rei Charles III, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) falou com a imprensa brasileira em Londres e fez uma das críticas mais severas a Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, desde que voltou ao Palácio do Planalto. Sem citar o nome do economista — tratando-o muitas vezes como “esse sujeito” —, o petista sugeriu que Campos Neto segue fiel a Jair Bolsonaro, quem o conduziu à presidência da autoridade monetária em 2019. Seu mandato só terminará em dezembro do ano que vem. “Eu não bato no Banco Central porque o Banco Central não é gente. O que eu discordo é da política. Quem concorda com a taxa de juros a 13,75% que a defenda publicamente. Nós não temos inflação que garanta qualquer argumento de dizer: ‘Nós precisamos manter a taxa de juros alta porque não vamos cumprir a meta’. Não quero nem discutir isso outra vez porque a meta é o Conselho Monetário que determina. O que eu falo é o seguinte: a sociedade, os varejistas, os empresários e os trabalhadores brasileiros não suportam mais a taxa de juros. O desemprego começou a mostrar sua cara no setor de comércios. Se queremos gerar emprego, temos que ter crédito. Senão o país não cresce”, disse Lula.

“Não discuto autonomia do Banco Central. Eu indiquei um presidente [do BC] que era deputado federal eleito pelo PSDB, e eu nem conhecia o [Henrique] Meirelles. Duvido que esse cidadão tenha mais autonomia que o Meirelles teve. Só que o Meirelles tinha responsabilidade de ter um governo discutindo com ele, olhando as preocupações. Esse cidadão não tem. Ele não tem nenhum compromisso comigo. Ele tem compromisso com quem? Com o Brasil? Não tem. Ele tem compromisso com o outro governo, que o indicou. E com aqueles que gostam de taxa de juros alta. Não há outra explicação”, seguiu o petista.

As ferozes críticas de Lula a Campos Neto vêm a reboque da última decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom). Na última quarta-feira, 10, pela sexta vez consecutiva, o BC manteve a taxa Selic em 13,75%, a despeito da pressão do governo para baixá-la. Lula e seus aliados acreditavam que já havia motivos para a autoridade monetária reduzir os juros, sobretudo após o governo federal apresentar o arcabouço fiscal. No entanto, o comitê justificou que o ambiente externo se mantém adverso e que inflação alta para o consumidor demanda atenção. “Os episódios envolvendo bancos no exterior têm elevado a incerteza, mas com contágio limitado sobre as condições financeiras até o momento, requerendo contínuo monitoramento. Em paralelo, os bancos centrais das principais economias seguem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas, em um ambiente em que a inflação se mostra resiliente. Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores mais recentes de atividade econômica segue corroborando o cenário de desaceleração esperado pelo Copom, ainda que exibindo maior resiliência no mercado de trabalho. A inflação ao consumidor, assim como suas diversas medidas de inflação subjacente, segue acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação.”

O teor do comunicado deixou o Palácio do Planalto extremamente contrariado, sobretudo com o trecho que fala sobre a perseguição da meta para a inflação. “Outro dia, em uma entrevista, ele disse: ‘Para atingir a meta de 3%, a taxa de juros tem que chegar acima de 20%. Está louco? Esse cidadão não pode estar falando a verdade. Se eu como presidente não puder reclamar dos equívocos do presidente do Banco Central, quem vai reclamar? O presidente americano? Me desculpem, o Banco Central tem autonomia, mas não é intocável”, finalizou o presidente.