Messi leva a Argentina ao título da Copa após 36 anos, vira ‘deus’ em seu país e tira das costas peso do tamanho do mundo

Em 27 de junho de 2016, Lionel Messi fez um anúncio que chocou o mundo do futebol. Com o semblante abatido — não era para menos, havia acabado de perder um pênalti contra o Chile, na decisão da Copa América —, remoendo a perda de mais um título para a Argentina, anunciou que havia chegado ao fim sua história na Alviceleste. “É incrível. Nós buscamos, tentamos… No vestiário pensei que a seleção não é para mim. É o que sinto agora, é uma tristeza grande. Foram quatro finais, infelizmente não consegui. Era o que mais desejava. É para o bem de todos. Muitos desejam isso”, disse o craque. Pesava sobre seus ombros as derrotas nas finais de três Copas Américas (2007, 2015 e 2016) e uma Copa do Mundo (2014). Para sorte dos argentinos, a aposentadoria não durou dois meses. E neste domingo, 18, no Catar, o jogador certa vez chamado de “pipoqueiro” por torcedores mais apressados do país vizinho fechou seu belíssimo ciclo na seleção argentina com a Copa do Mundo, a primeira dos “hermanos” em 36 anos (e o único troféu que faltava à sua estupenda carreira).

Como em um bom tango, houve espaço para mais sofrimento após o retorno ao time nacional. Na Copa do Mundo de 2018, Messi encontrou uma equipe em frangalhos, nada parecida com aquela que perdeu o Mundial de 2014 para a Alemanha somente na prorrogação. Quase ninguém respeitava o técnico Jorge Sampaoli, que saiu da Rússia com a imagem chamuscada — e só a recuperou no futebol brasileiro, fazendo bons trabalhos no Santos e no Atlético-MG. No entanto, os dedos em Buenos Aires, Rosário, La Plata e Mendoza ainda apontavam na direção do camisa 10. Até Maradona, sempre tão carinhoso com o pupilo, carregou nas críticas: “É inútil querer tornar líder um homem que vai ao banheiro 20 vezes antes da partida. Não deveríamos mais endeusá-lo. Messi é Messi jogando pelo Barcelona. Na Argentina, é mais um”. A redenção chegou apenas em 2021, com a volta de Messi ao Maracanã. Em uma Copa América que quase foi cancelada por causa da crise da Covid-19, a Argentina venceu a Seleção Brasileira no mítico estádio carioca e encerrou um jejum de 30 anos sem nenhum título.

O 3 a 0 sobre a Itália em junho, na recém-criada Finalíssima (torneio de um jogo que reúne as seleções campeãs da América do Sul e da Europa), sinalizaram que Lionel Messi e seus companheiros estavam realmente mais leves após a conquista no Rio de Janeiro. Não à toa, a música que embala a Albiceleste nas arquibancadas do Catar rememora o título em cima do Brasil: “Não posso explicar/Porque não vai entender/As finais que perdemos/Quantos anos as chorei/Mas isso terminou/Porque no Maracanã/A final com os ‘brasucas’/Papai voltou a ganhar”.

Também não é coincidência que outra famosa canção de estádio diga que a torcida argentina é “a que tem Messi e Maradona”. No Catar, Lionel parece ter encarnado o ídolo morto em novembro de 2020, após uma parada cardíaca. “Diego está nos empurrando lá de cima”, declarou o atual dono da camisa 10 no começo da Copa.

Em sua última dança, Messi resolveu ser mais “maradoniano”. Ele briga, xinga, provoca, não se esconde. Virou o líder que todos queriam. Contra a Holanda, nas quartas de final, discutiu com adversários e xingou um repórter: “Está olhando o quê, bobo?”. Tudo isso sem se esquivar do cargo de referência técnica da equipe.  Superou os cinco gols de Diego Maradona em 1986 (fez sete) e, com 13 bolas na rede em cinco Mundiais, ainda passou Maradona (9) e Batistuta (10) para se tornar o maior goleador da Alviceslete na história das Copas. Os cânticos, os murais pintados em Buenos Aires e o sorriso estampado na cara de todo “hermano” deixa claro o que todos suspeitavam: há espaço hoje para dois deuses no olimpo argentino.