O verdadeiro espírito do Natal, aquele que dispensa a mesa farta e a bebida mais nobre

Ano a ano tenho, às vésperas do Natal, apresentado sugestões de vinhos para a ceia e/ou almoço de Natal. Visito harmonizações clássicas e trago algumas inovações. Às vezes coloco algumas pitadas de ironia e outras de congraçamento. Este ano quero focar mais no real espírito de Natal, aquele que dispensa a mesa farta e a bebida mais nobre. E começo destacando o que significa o Natal, de verdade: é uma festa de aniversário, e é o aniversário da pessoa mais importante dos últimos dois mil e vinte e três anos. Não só para os cristãos, mas para o mundo, porquanto mudou a história do planeta de tal forma que seu nome passou a ser o divisor de águas do tempo, ou da medida do tempo. 

Nenhuma religião lega sua excelência, o recepcionando como Divino Mestre, Salvador, Profeta ou Ser de Inspiração; assim comemorar com capricho seu nascimento é mais que normal e aceitável. A verdade é que o Natal se transformou numa festa que mistura tradições de muitas origens com um consumismo desenfreado que, apesar do comércio eletrônico, continua mobilizando as cidades. As luzes, as árvores, as compras, as feiras e o jantar da empresa talvez não nos deixem ver o principal: o Natal é uma festa religiosa com o fim de sagrar e comemorar o nascimento de Jesus Cristo. Sobre a data da comemoração do Natal me estribo em Guillermo Altares (El Pais, 19/12/2017), que nos conta que “o solstício de inverno (no Hemisfério Norte) é a noite mais longa do ano, o momento em que os dias começam de novo a crescer, uma vitória simbólica do Sol contra a escuridão. Acontece entre 21 e 22 de dezembro e é comemorado desde tempos imemoriais”. O historiador Richard Cohen relata, em seu livro Persiguiendo el Sol: La historia épica del astro que nos da la vida (perseguindo o sol: a história épica do astro que nos dá a vida) que “praticamente todas as culturas têm uma forma de celebrar esse momento”. “O aparente poder sobrenatural para governar as estações, que se manifesta nos solstícios, inspirou reações de todos os tipos: ritos de fertilidade, festivais relacionados com o fogo, oferendas aos deuses”, afirma Cohen.

Nessa mesma época do ano, em meados de dezembro, os antigos romanos festejavam a Saturnália, festival em que eles ofereciam presentes entre si, mas também trocavam os papéis sociais, uma mistura entre nosso Natal e o Carnaval.A data do Natal foi fixada em 25 de dezembro pelo imperador Constantino, porque nesse dia era celebrada a grande festa solar em Roma”, explica Ramón Teja, professor emérito de História Antiga da Universidade de Cantábria (Espanha), especialista em história do cristianismo e presidente de honra da Sociedade Espanhola de Ciência das Religiões. Assim, o imperador que transformou o cristianismo na religião de Roma, e que governou entre 306 e 337, identificava de alguma maneira sua figura com o divino, aproveitando o antigo festival do Dia do Nascimento do Sol Invicto. “Foi uma fusão do culto solar com o culto cristão”, diz Teja. A verdadeira data de nascimento de Jesus é um grande mistério e de assaz controvérsia e o que mais se aproxima da realidade é que Ele teria nascido no dia que corresponde a 6 de janeiro do ano zero, da Era Cristã. Entretanto, em que pese todas estas considerações, o que importa é a elevação do pensamento ao Pai, imbuídos em um espírito de caridade, seja na oração enclausurada ou no tilintar das taças ao se desejar um Feliz Natal! Convido aos leitores que, ao invés de concentrar recursos em mesas excessivamente fartas e bebidas por sobremaneira caras, entendam os sinais de humildade da data e, sim, comemorem, brindem o nascimento de Cristo, com alguma simplicidade e levando os excessos para as mãos de quem carece de bens e, especialmente, do amor acolhedor. Pratiquem a Caridade, como brinde a vida e nascimento Dele, nosso Mestre Maior.  Salut!!!