Orçamento para 2024 mira receitas incertas e não se preocupa com redução dos gastos

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2024 foi encaminhado ao Congresso Nacional na última quinta-feira, 31. A estimativa do governo é de que os cofres públicos arrecadem R$ 5,54 trilhões no próximo ano e gastem a mesma quantia com as despesas da União. A meta de gestão de Lula é que 2024 se encerre com déficit zero, ou seja, as receitas e os gastos sejam iguais, sem dívidas ou lucro. Para conquistar esse objetivo, o governo conta com aprovação de algumas medidas que tramitam no Congresso, como a taxação das offshores e dos fundos fechados, conhecidos como super-ricos. Para especialistas ouvidos pela Jovem Pan, a estratégia da gestão petista conta com projeções muito otimistas e se baseiam em acordos que ainda precisam ser aprovados pelo Congresso Nacional. Além disso, eles analisam que o projeto foca muito em aumentar as receitas, mas sem se preocupar tanto em reduzir gastos. Esses fatores podem fazer com que o governo não consiga bater suas metas. Ainda assim, alguns se mostram confiantes com a proposta.

André Meirelles, diretor de Alocação e Distribuição da InvestSmart XP, avalia que o projeto conta com receitas superestimadas, que dependem de aprovação de mudanças tributárias que serão avaliadas pelo Congresso Nacional. “Neste sentido, sabe-se que o processo de debate e negociação na casa legislativa poderá não corresponder ao ímpeto do governo no que se refere ao aumento da arrecadação no montante necessário para cobrir os gastos. Portanto, apesar da sinalização de algum equilíbrio nas contas para 2024, muito deve ser ajustado no Congresso”, pondera. Alexandre Espirito Santo, economista-chefe da Órama Investimentos, opina que a meta de zerar o déficit no ano que vem é bastante desafiadora e representa uma aposta arriscada. “Não creio que seja natural. Existe um risco, pois o governo está contando com receitas incertas, daí a reforma ministerial ganhar ainda mais importância”, avalia.

Premissas otimistas e foco na arrecadação marcam o projeto para o orçamento público, na avaliação do economista Carlos Caixeta. Ele destaca que o governo federal trabalha com projeção de crescimento econômico de 2,3% em 2024, apontando que a estimativa está 70% mais otimista do que a do mercado, captada pelo relatório Focus mais recente do Banco Central. “De modo geral, há um esforço grande para se aumentar a arrecadação e não há ações para se reduzir gastos e despesas, o que é fundamental para a boa gestão pública. Importante a ênfase nas duas frentes, tanto na redução dos gastos e despesas quanto na arrecadação, pois assim haverá mais recursos para os investimentos, fundamentais para o país. A reforma administrativa precisa priorizar a eficiência da gestão pública”, pontua.

É possível cumprir o projeto? 

Consultor econômico da Remessa Online, André Galhardo observa que as projeções para métricas como o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) são bastante otimistas, mas possíveis. Ele pontua que o projeto não prevê reajustes no programa Bolsa Família e na remuneração dos servidores públicos, o que destoa da política do governo. “Com relação aos aumentos, é decepcionante. Há um aumento real no volume de investimentos por parte do governo, mas é muito tímido ainda. É inadmissível que a gente fale de R$ 70 bilhões de investimento em um ano em um país do tamanho do Brasil. O governo também não previu nova isenção no imposto de renda”, indicou. Ele considera que o governo inclui no projeto apenas o que tem certeza de que consegue cumprir.

O economista também comenta que há um recorrente problema de frustração de receitas no Brasil, não apenas ao nível federal. Ele complementa que é comum que, no orçamento, as receitas sejam projetadas bem acima do que o de fato acaba sendo arrecadado. “Apesar disso, essa peça em específico não tem muita diferença das demais em relação à possibilidade de frustração de receitas. Colocar uma projeção de déficit nulo é sensato por parte do governo, apesar de reconhecer as dificuldades e os problemas que podem surgir ao longo do caminho, porque boa parte das receitas que o governo espera obter deve passar pela aprovação do Congresso. Mas muitas delas já estão sendo discutidas, o que abre caminho para que isso aconteça. As expectativas são boas”, considera.

Professor de Economia do setor público da Strong Business School, Moisés Pais dos Santos, explica que a proposta orçamentária é algo extremamente complexo e que o modelo de orçamento do Brasil é autorizativo, apenas um pequeno percentual é impositivo. “Isso significa que o governo não é obrigado, por lei, a executar 100% daquilo que está previsto na lei orçamentária. Por essa natureza e por diversas outras razões, dificilmente o valor previsto coincide com o valor executado. Há diversos desafios para que o orçamento previsto chegue o mais próximo possível do valor executado. Entre eles, destaca-se o crescimento econômico, aumento da arrecadação, controle das despesas e, especialmente, a queda da taxa de juros”, considera.

Ele ainda complementa que o governo acertou no prazo de entrega, na sintonia dos ministros que favorece a governabilidade, na sinalização para o mercado e para toda a sociedade brasileira que se preocupa com o controle das contas públicas. “Também se destaca que, pela primeira vez, no país houve Plano Plurianual (PPA) participativo, permitindo que diversos atores espalhados por esse imenso país pudessem participar. E o PLOA deve estar sintonizado com o PPA”, indica. Moisés finaliza afirmando que não dá para falar em erro neste momento porque o documento está em discussão e a peça é técnica, utilizando dado oficiais e projeções que seguem métodos científicos rigorosos e são embasadas na legislação.