Entenda: greve de trabalhadores da Qintess começa na segunda-feira (10)

Greves e movimentos sindicais no setor de TI não são muito comuns, por isso chamou atenção o anúncio feito pelos profissionais da Qintess no último dia 31 de março. Reunidos em assembleia online organizada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo (Sindpd-SP), com quórum de mais de 800 pessoas, eles decidiram “cruzar os braços” a partir de 10 de maio, próxima segunda-feira.

Uma proposta inicial da empresa foi apresentada e rejeitada pela assembleia por ser considerada “vaga”. No documento a empresa se compromete “a negociar com o Sindicato os temas vindouros” e diz que já regularizou benefícios como vale alimentação e refeição – o que os grevistas negam. Também a regularizar pagamentos ao FGTS em 120 dias.

A votação, segundo o sindicato, teve ampla maioria dos votantes favoráveis à greve, ou quase 70%. Antonio Fernandes dos Santos Neto, presidente do Sindpd-SP, contou ao IT Forum que a decisão é o ápice de um longo processo de desgaste da relação com os trabalhadores da empresa (muitos deles alocados em outras companhias) devido principalmente a atrasos no pagamento de salários, direitos trabalhistas e obrigações legais, como FGTS, mesmo depois de um acordo de convenção coletiva que prometia regularizar as pendências.

“Em dezembro de 2021 conseguimos fechar uma [acordo de] convenção coletiva com o patronato. Acertava um problema de quatro anos, desde 2018 [de salários atrasados]”, relembrou Santos Neto. “Em janeiro de 2022 a empresa tinha que fazer pagamento do retroativo de horas extras, todas as diferenças. O grupo Qintess não se colocou para pagar. Tivemos que fazer uma ação na Justiça que está rolando, e que eles parcelaram, mas ainda não sabemos se pagaram todas as parcelas.”

Segundo o sindicalista, há constantes atrasos no pagamento de salários, férias, vale-refeição e alimentação, vale-transporte, reembolso por quilômetros rodados, banco de horas e depósitos do FGTS. Denúncias também apontam que, apesar de desconto feitos nos holerites dos trabalhadores, os valores referentes ao imposto de renda não foram repassados para a Receita Federal – o que teria levado alguns a caírem na malha-fina.

Também foram recebidas denúncias de assédio moral contra funcionários que cobraram posicionamentos da empresa – o que inclusive levou o sindicato a disponibilizar um canal para o recebimento de notícias do tipo via WhatsApp e e-mail.

Também há relatos de trabalhadores demitidos nos últimos meses e que acionaram o sindicato cobrando verbas rescisórias em atraso. Santos Neto diz que parte dessas demissões sequer foi homologada pelo sindicato.

A principal reivindicação do Sindpd-SP é ter acesso a todos os valores devidos pela Qintess aos trabalhadores, além da regularização de todos os débitos e um compromisso formal de não mais atrasar pagamentos. Também o pagamento de abonos e indenizações pelos atrasos.

Denúncias e adesão

“Nos assustou a quantidade de denúncias. São dezenas. É uma empresa que tem folha de pagamento enorme”, diz o líder sindical. A Qintess, liderada pelo midiático CEO Nana Baffour, é fruto de uma fusão feita em 2019 entre o Grupo Cimcorp e a Resource, esta última um player importante de outsourcing e integração tecnológica, especialmente para o mercado financeiro, até o anúncio de sua compra.

A empresa tem atualmente cerca de 2.500 funcionários, parte deles alocados em players importantes, como Via Varejo, Natura, Raizen, IBM, Banco Santander, Banco Pan, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, entre outros. Presta serviços também para órgãos públicos, como (por ironia) o Tribunal Regional do Trabalho (TRT-2), Procuradoria Geral do Estado de São Paulo e Ministério da Justiça, entre outros.

“Dentro do rito de greve, por [tecnologia] ser um setor essencial, temos que dar 72 horas [para negociação]”, explicou o líder sindical. “Cairia na quinta (6) depois do almoço, que é véspera de feriado, por isso decidimos em assembleia começar à 0h do dia 10 [de abril]. Então demos mais de 72 horas.”

Para Santos Neto, os problemas de pagamento não decorrem de resultados ruins por parte da Qintess, mas sim de “uma prática rotineira de desrespeito aos direitos dos trabalhadores”. O sindicalista diz que a resolução do problema e o cancelamento da greve é “simples”: “é só fazer o pagamento.”

O sindicato espera que a adesão ao movimento seja grande, considerando o quórum elevado da assembleia. Santos Neto diz que estão preparados protesto em frente a alguns dos contratantes da Qintess na segunda “para dar visibilidade entre tomadores de serviços”.

O Sindpd-SP contabiliza cerca de 35 mil trabalhadores atualmente. Para o presidente da entidade, a greve dos funcionários da Qintess é simbólica porque “embora seja uma categoria não-obreira, também reivindica seus direitos”.

Além disso, diz o sindicalista, os trabalhadores da TI são “uma categoria diferente”, o que facilitaria a mobilização. “O fato de estarem em casa e não logarem [o computador] faz com que o movimento seja mais amplo”.

“Até agora não tivemos respostas concretas. Até domingo, se a empresa resolver, não tem por que fazer greve”, diz.

Resposta oficial

O IT Forum pediu uma entrevista para a Qintess. Obteve retorno em nota por e-mail na terça (4). Nela, a empresa diz que foi notificada pelo Sindpd-SP sobre a greve, e que pretende continuar negociando, mas não entra em detalhes sobre as reivindicações dos grevistas.

“Com mais de 25 anos de história, a Qintess está ciente da importância dos direitos de seus colaboradores e de sua livre manifestação. Por este motivo, respeitará a decisão particular destes, ao mesmo tempo em que segue empenhada em construir uma solução”, escreve a companhia.

“A Qintess continua negociando um acordo que atenda aos interesses de todos os envolvidos sob os princípios da boa-fé, de forma tranquila e transparente. A Qintess também está mobilizada para garantir a continuidade dos serviços de seus clientes e seus negócios, focada no objetivo de alcançar uma resolução responsável e serena para todas as partes.”

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