Quem tem medo do metaverso?

Talvez a humanidade nunca tenha experimentado um avanço tecnológico tão rápido quanto o das últimas décadas. O que já vinha num ritmo acelerado aumentou ainda mais com a Covid-19, que forçou as empresas a antecipar para meses um processo de digitalização que levaria anos.

Isso tem tornado consumidores e empresas cada vez mais exigentes (para não dizer apressados) com qualquer inovação que se apresenta. Nesse processo, esquecem que o avanço tecnológico não acontece do dia para a noite, mas é o resultado de um longo processo de pesquisa e desenvolvimento em diversas áreas.

Difícil achar quem ainda não tenha ouvido falar do Metaverso depois de o termo ter sido popularizado por Marc Zuckerberg, CEO da Meta em outubro de 2021. Mas a verdade é que a palavra existe há 30 anos: Metaverso é um conceito criado por Neil Stephenson no livro Snow Crash, publicado em 1992.

Apesar de popular, o termo é bastante incompreendido. O que não falta são previsões que apontam para um fim melancólico para o Metaverso. Na visão de muitos críticos, o frisson acabará antes do cumprimento das projeções mais otimistas – que o Metaverso provocaria a próxima revolução na internet.

A verdade é que esse ceticismo em relação a novas tecnologias é um fenômeno velho e conhecido. Thomas Edison não acreditava no uso da corrente alternada na eletricidade, (invenção de Nikola Tesla); Steve Jobs declarou que o modelo de assinatura de streaming fracassaria; e até mesmo Einstein duvidou da viabilidade da energia atômica.

Empresários questionam o sentido de entrar agora no Metaverso se a previsão é que a tecnologia estará madura talvez apenas em dez anos. Alguns se queixam que os gráficos são simples demais e as experiências limitadas. Outros dizem que não há cases de sucesso que justifiquem o investimento.

As críticas fazem sentido. De fato, hoje as experiências no Metaverso são limitadas pelo desenvolvimento tecnológico, que ainda precisa avançar para destravar o potencial desse novo universo. Mas imagine se Jeff Bezos tivesse desistido de criar a Amazon – porque não havia cases de sucesso e a conexão com a internet era muito lenta – e se as empresas tivessem abandonado a telefonia móvel – porque os celulares eram grandes e demais e o sinal pouco confiável.

Hoje é fácil reconhecer as revoluções causadas pela internet e pela telefonia móvel são inquestionáveis. Difícil é lembrar que foram necessárias algumas décadas para que essas tecnologias alcançassem o estágio de maturidade que permitisse essas revoluções No caminho, algumas tecnologias não se consolidaram – mas todas contribuíram para o aprendizado que ajudou a pavimentar o caminho das que seguiram.

Muitas empresas que optaram por esperar o amadurecimento dessas tecnologias para adotá-las não conseguiram alcançar as companhias que apostaram mais cedo nelas. Recuperar o atraso demanda um esforço – financeiro e de aprendizado – muito grande.

Só para citar alguns exemplos: a Sony criou o Walkman e foi pioneira na tecnologia dos CDs. Mas não acreditou no avanço das tecnologias digitais e perdeu espaço. Pior foi a Kodak: a empresa, fundada por George Eastman em 1880, tinha inventado a câmera digital em 1975. Mas optou por priorizar as câmeras analógicas, acreditando que poderia lucrar mais na venda de filmes e papeis fotográficos. O resultado: a empresa, que chegou a ser uma das grandes estrelas da bolsa de Nova York, hoje tem uma fração do tamanho que chegou a ter.

Já as pioneiras colhem os frutos de terem enfrentado o medo e a insegurança que a inovação provoca. Afinal, não é preciso ser marinheiro para saber que não é simples navegar em águas desconhecidas. Mas, como diz Fernando Pessoa, navegar é preciso.

O Metaverso é um conceito ainda pouco compreendido.  Está longe de haver um consenso sobre o que significa e suas possibilidades. Mas há um ponto sobre o qual (quase) todos concordam: ele influenciará diretamente a evolução do que conhecemos hoje como internet.

Mais do que uma tecnologia, o Metaverso é um conjunto de tecnologias, especialmente: realidade aumentada e virtual, que permitem experiências tridimensionais e imersivas mais próximas da forma como percebemos e interagimos com o mundo real; o Blockchain, que descentraliza o controle dos dados, ou seja, permite que os usuários e não as grandes corporações tenham o controle de quem guarda, consulta e utiliza suas informações.

Essas tecnologias ainda são muito novas e adotam paradigmas muito diferentes dos que nos acostumamos nas últimas décadas navegando na internet atual. Portanto, é natural que ainda sejam incompreendidas. Especialmente para a geração que ainda não familiarizada com jogos como Roblox, Sandbox ou Fortnite, que têm um ambiente parecido com o Metaverso.

Para os que estão habituados a esses jogos, a interação em mundos virtuais 3D e a aquisição de criptoativos já são uma realidade. As crianças que cresceram nessa realidade vão exigir experiências similares ou melhores das que já estão habituados quando atingirem a maioridade e entrarem para o mercado consumidor e de trabalho.

Essas mudanças irão demandar uma enorme capacidade de adaptação. Mas trarão grandes melhorias na forma como consumimos informação ou nos relacionamos em sociedade – e criarão muitas oportunidades de negócio que nem sequer imaginamos.

Problemas antigos encontrarão soluções inovadoras e novas soluções trarão novos problemas. A boa notícia é que o poder de direcionar essas mudanças estará nas mãos de quem estiver disposto a abrir as estradas que irão nos levar a esse novo mundo.  E, como em toda corrida, na disputa pela evolução tecnológica, sair na frente é sempre bom.

*Rogério Mello Lima, expert engineer na NTT DATA e especialista em tecnologias imersivas