Rússia está exportando todo o fertilizante que pode

A guerra entre Rússia e Ucrânia vai completar um ano em fevereiro e os sobressaltos nos preços dos fertilizantes não devem fazer parte da história de 2023, de acordo com a consultoria StoneX. “A guerra e os efeitos da guerra, no atual estágio em que estão, já estão incorporados tanto na cadeia de suprimento, ou seja, a Rússia está exportando tudo o que ela pode e se não está exportando mais é porque tem receio de faltar algum fertilizante interno para ela ou tem alguma restrição de energia como no mundo todo”, explica Marcelo Mello, head de fertilizantes da empresa. A Rússia é um dos principais fornecedores de fertilizantes para o Brasil e o envolvimento dela na guerra fez com que o insumo atingisse picos históricos de preços em 2022. O risco de abastecimento também rondava a cadeia agro e agora há sinalizações de conforto para o abastecimento. A relação de troca entre soja e fertilizante atingiu a melhor proporção desde 2020 e está animando agricultores a acelerarem compras antecipadas para a safra 2023/2024 da planta, que começará a ser semeada apenas em setembro deste ano. Saiba mais sobre o mercado de adubos na entrevista abaixo:

As compras antecipadas de fertilizantes já estão acima da média? Nós temos uma pesquisa que fazemos a cada três meses e a última foi feita em novembro e mostrou uma baixa antecipação de compras. Mas sentimos que a partir de dezembro, o mercado começou a rodar com mais força e acreditamos que isso vai continuar no primeiro trimestre. Nós vamos fazer nova pesquisa em fevereiro, mas acredito que esteja perto de 40% já efetivado. E por que isso está acontecendo? Nós saímos de dois, três anos de sobressaltos, muito complicados e estamos em um momento que dá para definir como confortável por um lado por conta da queda dos fertilizantes e por outro, por uma certa estabilidade e com preços bons para os grãos. Então os dois fatores juntos trazem uma boa relação de troca e fazem a antecipação começar a ocorrer.

No MAP para a soja da safra verão que será plantada, nós chegamos a ter uma relação muito ruim, no auge do problema, eram necessárias 34 sacas para comprar uma tonelada de MAP, que é o fertilizante de fósforo de alto teor mais utilizado no Brasil. E depois com essa queda intensa a partir de abril no preço do MAP até dezembro, e em paralelo, se você pegar a soja, de agosto até agora, ela subiu 15%. Então isso ajuda na relação entre os dois e fez a relação de troca chegar abaixo da média, está em cerca de 18 ou 19 sacas e chegamos abaixo disso, em 17 sacas, e agora estamos na média, é a melhor relação dos últimos dois anos, muito melhor do que as 34 sacas do pico.

Essa melhora da relação de troca é uma tendência? Os riscos de alta dos preços estão dissipados? A guerra, os efeitos da guerra, no atual estágio em que está, já estão incorporados tanto na cadeia de suprimento, ou seja, a Rússia está exportando tudo o que ela pode e se não está exportando mais é porque tm em receio de faltar algum fertilizante interno para ela ou tem alguma restrição de energia como no mundo todo. Mas, fora isso, ela está no suprimento e no preço. Vejo três cenários básicos para a guerra: o primeiro seria o fim da guerra, mas não acredito que esteja tão perto. Mas isso não alteraria [o preço] porque a Rússia já está produzindo o máximo de fertilizantes e exportando o máximo que consegue. O segundo cenário é a manutenção da guerra no estágio que está e o terceiro, que não me parece provável, que é um aprofundamento muito sério da guerra, com algum problema nuclear ou um avanço no território russo que atingisse as cadeias logísticas de exportação de fertilizantes ou até mesmo a produção, o que não me parece ocorrer.

Então a guerra já não é mais um problema nesse sentido, ela é neutra. E dentro dessa visão, acreditamos que estamos em um canal de queda, os preços em 2023 tendem a ser significativamente mais baixos do que em 2022, mas isso não significa que o preço só caia. Visualizamos um aumento do MAP, que caiu até novembro, esteve estável e agora está subindo por conta da antecipação de compra e isso tende a se manter. Acreditamos que ele possa subir mais uns 20%, 25% até maio por conta da demanda interna e o que está acontecendo no exterior. Na verdade, o Brasil é uma exceção no mundo pois apesar de plantarmos em setembro, a gente antecipa compra. Se você vai nos Estados Unidos, isso é raríssimo, eles não antecipam a compra, a maior parte dos produtores agrícolas vão comprar na hora que tem que plantar, no último momento. Então os dealers, os distribuidores, as cooperativas, tem que comprar para se preparar para atender a demanda lá nos Estados Unidos, mas a demanda vai vir na hora efetiva do plantio. No Brasil não, a demanda vem basicamente antes. Então, nós estamos junto com os EUA no mercado, os Estados Unidos vão entrar daqui 20, 30 dias e vai estar comprando forte fósforo, potássio e nitrogênio para o plantio deles de milho e soja na primavera.

No cloreto de potássio, tivemos uma relação de 31 sacas de soja para comprar 1 tonelada de potássio, foi a pior relação dos últimos cinco anos e isso começa a crescer fortemente em 2021 até atingir o auge em março e abril de 2022, quanto o potássio bate o maior preço. De lá para cá a soja subiu e o potássio caiu quase 60%.

O preço do fertilizante vai cair mais? Acredito que não, porque assim como o fósforo, o fósforo tem espaço para subir, já subiu 10% e tem espaço para subir mais 25%. Na minha opinião, é o fertilizante com pior fundamento do complexo NPK. Há muitas produções sendo expandidas, novas produções que vão entrar no mercado em 2 ou 3 anos e temos a Bielorussia que está fora do mercado e conseguindo exportar 3 milhões de toneladas por ano de uma capacidade de 12 milhões de toneladas. Mas, ela deve sair dessas 3 milhões de toneladas e subir para 5,6 milhões de toneladas. Acho que potássio tem o pior fundamento. Apesar disso, a estrutura de produção internacional é oligopolizada e ainda sim é possível que preço subam, mas deve subir menos que o fósforo, poderia subir uns 10% e 15% a partir de fevereiro ou março até maio e junho, mas isso depende também de um contrato de longo prazo que a China e a Índia estão fazendo. Então acho que a relação de troca não tende a melhorar mas, o momento é de antecipação. No caso do potássio, eu preferiria esperar a confirmação do contrato da Índia com a China, mas não sei se vai dar tempo, é possível que o mercado possa subir antes disso.

O uso de fertilizantes vai aumentar neste ano? O ano passado, até porque o preço estava alto e a relação de troca no pico histórico, aconteceu o que chamamos de uma destruição de demanda. O produtor rural comprou um volume menor para aplicar menos, utilizando o MAP e potássio que estavam na terra de aplicações passadas. Ele fez isso constrangido e nosso cálculo é que em 2022, o Brasil vai ter tido redução entre 10% e 15%, mais precisamente entre 11% e 16%. Neste ano, a situação deve ser inversa, não vamos subir 10% no total de venda, mas a gente imagina que pelo menos 5% nós vamos. Então haverá aumento, teremos mais demanda e risco de desabastecimento é zero, está tudo muito confortável.

O volume de importação em 2023 poderá ser recorde? Acho difícil nós voltarmos ao patamar que tivemos em 2021, que foi muito forte. Nós entregamos, ou seja, o consumo aparente foi de 45,5 milhões de toneladas com importação de 40 milhões, mas acho que podemos voltar a 43, 44 milhões de toneladas a gente consiga [importar].