Supremo volta a discutir maconha, enquanto PEC contra as drogas avança

O Supremo Tribunal Federal está a um voto de constituir maioria pela despenalização do porte de maconha para uso pessoal. Em agosto, quando o placar marcava 5 votos a 1, o julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro André Mendonça, que precisa devolver o caso a plenário ainda este mês. Questiona-se a constitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343/2006, a lei das drogas, que proibiu o porte de drogas para uso pessoal. Na prática, a tese sustenta que a proibição do uso de drogas violaria os princípios de “intimidade e vida privada”. Embora não tenha ainda concluído o julgamento, o STF já formou maioria para definir que pessoas com pequenas porções de maconha não devem ser tratadas como traficantes, restando definir a quantidade limite. Ganha força a proposta do ministro Luís Roberto Barroso, agora presidente da Corte, que sugeriu legalizar o porto de até 25 gramas para usuários — baseado na experiência de Portugal. A tentativa do Supremo de legislar, especialmente sobre tema tão complexo, provocou uma reação enérgica do Congresso — semelhante à ocorrida no caso do Marco Temporal. Os parlamentares agora correm contra o tempo para aprovar uma política de tolerância zero em relação ao consumo de entorpecentes. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), apresentou de próprio punho uma proposta de emenda constitucional para criminalizar de forma taxativa qualquer posse ou porte de drogas. A PEC ganhou apoio de parlamentares de partidos de direita, de centro, mas também de esquerda, como a senadora Eliziane Gama (PSB/MA), relatora da CPMI do 8 de janeiro e algoz do bolsonarismo. O caso ganhou relatoria do senador Efraim Filho (União Brasil/PB), que já deixou clara sua posição. “Se a droga continua ilícita, onde eu vou adquirir? De quem eu vou comprar? Não vende em farmácia, não vende em mercado. Eu vou comprar do tráfico. Comprar do tráfico é financiar o crime organizado. O crime organizado é responsável, hoje, pelas maiores barbáries da sociedade moderna.”

Na verdade, o caso é bem mais grave. Na justificativa da PEC, Pacheco deixa isso claro ao elencar todo o repertório constitucional e legal envolvendo o tráfico. No artigo 5, a Constituição equiparou o tráfico aos crimes hediondos. No capítulo 144, da segurança pública, incumbiu a Polícia Federal de prevenir e reprimir o “tráfico ilícito de entorpecentes”. O artigo 243 também prevê a expropriação de terras utilizadas para o plantio de drogas e a apreensão de bens e valores decorrentes do crime. Por força da emenda constitucional 65/2010, ficou estabelecida também a necessidade de “programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins”. O exemplo da despenalização promovida em Portugal é mal compreendido por aqui. O consumo permanece ilegal, com a diferença de que o usuário detido é convidado a entrar em um programa de tratamento para dependentes. Caso contrário, deverá pagar uma multa. O cultivo pessoal da maconha também permanece proibido. O caminho escolhido por nossos patrícios foi o das políticas de redução de danos e reinserção social. O usuário pode não ser tratado como criminoso, mas é considerado um dependente químico. Embora o consumo não tenha variado significativamente desde a aprovação da lei em 2001, nos últimos anos vêm aumentando o número de atendimentos emergenciais de quadros de psicose aguda e esquizofrenia: 49% dos pacientes são considerados dependentes crônicos, o que enfraquece a tese de que a maconha traria menos risco à saúde. Descriminalizar pode ser uma via alternativa à redução de prisões de usuários, mas cobra seu preço social e financeiro.

Assista ao JP Ponto Final que foi ao ar no sábado, 23h30, com a presença do senador Efraim Filho, relator da PEC, e do deputado Tarcísio Motta (PSOL/RJ):